Eça de Queirós
A obra de Eça de Queirós é canónica também porque nela revemos temas e ideias que ajudam a identificar uma cultura, uma literatura e mesmo uma língua. Não por acaso, Eça foi confirmado nessa sua condição canónica por um dos mais famosos ensaístas da actualidade, Harold Bloom, justamente aquele que de forma mais expressiva e às vezes provocatória sublinhou a relevância e a legitimidade do cânone ocidental. Sendo assim, a leitura de Eça pode ser (e é quase sempre) um pretexto de reencontro com valores e com formas que, a mais do que um título, continuam a fazer sentido para nós.
O volume que agora se publica e a colecção em que ele se integra pretendem cumprir vários objectivos: revalorizar o escritor, promover a sua difusão, facultar elementos de trabalho precisos para utilização escolar, estimular a leitura ou a releitura, ajudar a relação crítica do leitor com os textos. Sem propósito de aprofundada exegese, este livro quer ser antes de tudo um simples e claro instrumento de trabalho para quantos ainda crêem que a leitura e o estudo dos nossos autores canónicos são pertinentes e oportunos.
Carlos Reis
| Editora | Edições 70 |
|---|---|
| Coleção | Cânone |
| Categorias | |
| Editora | Edições 70 |
| Negar Chronopost e Cobrança | Não |
| Autores | Carlos Reis |
CARLOS REIS é professor catedrático da Universidade de Coimbra, sendo especialista em Estudos Narrativos e em Literatura Portuguesa dos séculos XIX e XX, sobretudo no domínio dos estudos queirosianos. Autor de mais de vinte livros (último em data de publicação: Dicionário de Estudos Narrativos, 2018), ensinou em diversas universidades da Europa, dos Estados Unidos e do Brasil. Dirige a Edição Crítica das Obras de Eça de Queirós (17 volumes publicados) e coordenou a História Crítica da Literatura Portuguesa (9 volumes). Foi diretor da Biblioteca Nacional, reitor da Universidade Aberta e presidente da European Associations of Distance Teaching Universities. É membro da Real Academia Española e da Academia das Ciências de Lisboa. Foi distinguido com os prémios Jacinto do Prado Coelho (1996), Eduardo Lourenço (2019) e Vergílio Ferreira (2020). Presentemente é coordenador científico do Centro de Literatura Portuguesa.
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Introdução à Leitura de «Uma Abelha na Chuva»Nota Prévia A reedição deste pequeno trabalho, a mais de quinze anos de distância da sua primeira edição, pode parecer (mesmo ao seu autor...) um tanto estranha e algo deslocada, em relação ao estado actual dos estudos literários. Concebida no quadro de um projecto de investigação mais amplo e subordinada a uma orientação metodológica particular, esta análise do romance Uma Abelha na Chuva aparece agora como um trabalho inevitavelmente datado:-a narratologia evoluiu muito desde os anos 70, dilatou-se a bibliografia sobre Carlos de Oliveira e o conhecimento que hoje possuímos do Neo-Realismo é mais minucioso e circunstanciado do que então era. Como quer que seja e uma vez que parece ainda existir um público a quem esta monografia pode ser útil reedita-se agora a Introdução ao Estudo de Uma Abelha na Chuva, sem que no seu texto tenham sido introduzidas quaisquer alterações. Para o fazermos, necessitaríamos de condições (que não são só de tempo) para repensarmos a orgânica interna desta análise; o que talvez levasse levaria certamente a uma reescrita tão profunda que se perderia nela a marca do tempo em que este livro foi concebido. Carlos Reis Índice Introdução Neo-realismo e empenhamento literário Características pragmáticas Carlos de Oliveira e o discurso neo-realista Semiótica do Discurso Comunicação narrativa Códigos e mensagem Domínios semióticos Código Temporal Signos Relações sintácticas Código Representativo Signos Representação subjectiva Acção Economia da acção Níveis da acção Temática e Ideologia Expressão temática Relações sintácticas Relações semânticas Expressão ideológica Representação Simbólica Símbolo e prática semiótica Repertório simbólico -
Introdução à Leitura d' Os MaiasINTRODUÇÃO: Evolução literária • A crise do Naturalismo - PERSONAGEM: Centralidade • Caracterização • Educação • Representatividade social • Síntese - ESPAÇO: Características fundamentais • Espaço físico • Espaço social • Espaço psicológico • Síntese - ACÇÃO: Níveis e relevo da acção • Estrutura da intriga • Acção trágica • Síntese • PONTO DE VISTA: Modos de representação • Focalização omnisciente • Focalização interna • Síntese - TEMPO: Tempo da história • Tempo do discurso • Tempo psicológico • Síntese - IDEOLOGIA: Processos conotativos de expressão ideológica • Ideologia do narrador e da personagem central • Ideologia do trágico • Síntese -
Introdução à Leitura das «Viagens na Minha Terra»Propõe-se aqui fundamentalmente (e apenas) um percurso de leitura possível: aquele que procura adoptar o posicionamento que é próprio, em contexto escolar, da chamada leitura integral; a partir daí e pelo recurso aos instrumentos conceptuais que a narratologia faculta, privilegia-se uma exposição de teor marcadamente didáctico, numa linguagem tanto quanto possível clara, sem deixar de ser precisa do ponto de vista terminológico. E também, naturalmente, procurando-se atingir os sentidos fundamentais que dominam a obra, sem o que fracassará qualquer análise, por mais rigorosa que se pretenda. Índice INTRODUÇÃO: Formação cultural Garrett e o Romantismo A novelística garrettiana - ESTRUTURA DA NARRATIVA: Níveis narrativos Comunicação narrativa - VIAGENS: Géneros Temas - NOVELA: Personagens Conflitos - IDEOLOGIA: Discurso ideológico Novela Conclusão -
O Conhecimento da LiteraturaA LITERATURA COMO INSTITUIÇÃO: O campo literário e as fronteiras da literatura · A dimensão sociocultural da literatura · A obra literária como cosmovisão e signo ideoló-gico A LINGUAGEM LITERÁRIA: A dimensão estética da literatura · a linguagem literária · A semiose literária TEXTO LITERÁRIO E OBRA LITERÁRIA: O texto literário· Texto, contexto e macrotexto · Texto literário e obra literária: relações de integração TEXTO LITERÁRIO E ARQUITEXTUALIDADE: O conceito de arquitextualidade · Modos do discurso e géneros literários · O drama e o espectáculo teatral · crise e relativismo dos géneros literários A POESIA LÍRICA: A criação poética e a poesia lírica · FACTORES E ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DA POESIA LÍRICA · VERSO LIVRE E POESIA EXPERIMENTAL A NARRATIVA LITERÁRIA: Narrativa e narratividade · narrador e narratário · Níveis e categorias da narrativa A EVOLUÇÃO LITERÁRIA: A evolução literária · Factores de constituição periodológica OS PERÍODOS LITERÁRIOS:Períodos e subperíodos literários · Classicismo e Romantismo · Pré-Romantismo e Romantismo · Realismo e Naturalismo · Modernismo e Futurismo · Relativismo e actualidade dos períodos literários Apêndice: Textos doutrinários.O livro que agora se publica é, desde o seu título e subtítulo, um livro de introdução a um certo conhecimento: o da literatura, na medida em que ela constitui um campo de formas e de representação de sentidos que, até certo ponto, é possível conhecer, exactamente porque nele surpreendemos elementos susceptíveis de descrição e de apreensão. Mais ainda: antes da manifestação desses elementos, revelam-se-nos também circunstâncias e factores de condicionamento que, à sua maneira e na proporção que lhes cabe, permitem entender a emergência e a institucionalização disso a que chamamos literatura. -
Dicionário de Estudos Narrativos - Versão cartonadaNa origem do Dicionário de Estudos Narrativos está o Dicionário de Narratologia, publicado pela primeira vez, em coautoria com Ana Cristina Macário Lopes, há cerca de trinta anos. As entradas que dele restam na presente obra foram profundamente revistas e refundidas, enquanto muitas outras foram acrescentadas, correspondendo-se assim à considerável evolução e aprofundamento que os Estudos Narrativos conheceram nas últimas décadas. -
Dicionário de Estudos NarrativosNa origem do Dicionário de Estudos Narrativos está o Dicionário de Narratologia, publicado pela primeira vez, em coautoria com Ana Cristina Macário Lopes, há cerca de trinta anos. As entradas que dele restam na presente obra foram profundamente revistas e refundidas, enquanto muitas outras foram acrescentadas, correspondendo-se assim à considerável evolução e aprofundamento que os Estudos Narrativos conheceram nas últimas décadas. -
Diálogos com José SaramagoJosé Saramago entrevistado por Carlos Reis. Um registo de testemunhos realizado durante cerca de sete horas em que o professor universitário questiona o criador de Blimunda sobre a formação, a aprendizagem, a profissão e a condição de escritor. Sobre a História como experiência. José Saramago fala-nos sobre a linguagem da literatura, os géneros literários, a narrativa e o romance, sem omitir os temas e valores, os sentidos e destinos comuns. Uma obra disponibilizada para «leitores de diversa motivação: do leitor corrente dos romances de Saramago ao estudioso da sua obra, passando pelo professor que trabalha com os seus textos e pelo estudante que (supostamente) os lê». -
Poesia TrovadorescaOs livros desta coleção propõem a análise de textos que constam do Programa e Metas Curriculares de Português do Ensino Secundário. Enquanto auxiliares indispensáveis para o sucesso escolar, os títulos desta série destinam-se, antes de mais, ao aluno que deseje colher orientações de leitura inspiradas nos tópicos de conteúdo que se encontram no Programa, em particular os que se referem ao domínio da Educação Literária. Esta abordagem da Poesia Trovadoresca não só cumpre os objetivos referidos, como inclui diversas pistas para revisão e consolidação de conhecimentos. -
Farsa de Inês Pereira, Gil VicenteOs livros desta coleção propõem a análise de textos que constam do Programa e Metas Curriculares de Português do Ensino Secundário. Enquanto auxiliares indispensáveis para o sucesso escolar, os títulos desta série destinam-se, antes de mais, ao aluno que deseje colher orientações de leitura inspiradas nos tópicos de conteúdo que se encontram no Programa, em particular os que se referem ao domínio da Educação Literária. Esta abordagem da Farsa de Inês Pereira não só cumpre os objetivos referidos, como inclui diversas pistas para revisão e consolidação de conhecimentos. -
O Ano da Morte de Ricardo ReisOs livros desta coleção propõem a análise de textos que constam do Programa e Metas Curriculares de Português do Ensino Secundário. Enquanto auxiliares indispensáveis para o sucesso escolar, os títulos desta série destinam-se, antes de mais, ao aluno que deseje colher orientações de leitura inspiradas nos tópicos de conteúdo que se encontram no Programa, em particular os que se referem ao domínio da Educação Literária. Esta abordagem de O Ano da Morte de Ricardo Reis não só cumpre os objetivos referidos, como inclui diversas pistas para revisão e consolidação de conhecimentos.
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Para Tão Curtos Amores, Tão Longa VidaNuma época e num país como o nosso, em que se regista um número muito elevado de divórcios, e em que muitos casais preferem «viver juntos» a casar-se, dando origem nas estatísticas a muitas crianças nascidas «fora do casamento», nesta época e neste país a pergunta mais próxima da realidade não é por que duram tão pouco tantos casamentos, mas antes: Por que é que há casamentos que duram até à morte dos cônjuges? Qual é o segredo? Há um segredo nisso? Este novo livro de Daniel Sampaio, que traz o título tão evocativo: Para Tão Curtos Amores, Tão Longa Vida, discute as relações afetivas breves e as prolongadas, a monogamia e a infidelidade, a importância da relação precoce com os pais e as vicissitudes do amor. Combinando dois estilos, o ficcional e o ensaístico, que domina na perfeição, o autor traz perante os nossos olhos, de modo muito transparente e sem preconceitos, tão abundantes nestas matérias, os problemas e dificuldades dos casais no mundo de hoje, as suas vitórias e derrotas na luta permanente para manterem viva a sua união.Um livro para todos nós porque (quase) todos nós, mais tarde ou mais cedo, passamos por isso. -
Sobre as MulheresSobre as Mulheres é uma amostra substancial da escrita de Susan Sontag em torno da questão da mulher. Ao longo dos sete ensaios e entrevistas (e de uma troca pública de argumentos), são abordados relevantes temas, como os desafios e a humilhação que as mulheres enfrentam à medida que envelhecem, a relação entre a luta pela libertação das mulheres e a luta de classes, a beleza, o feminismo, o fascismo, o cinema. Ao fim de cinquenta anos – datam dos primeiros anos da década de 1970 –, estes textos não envelheceram nem perderam pertinência. E, no seu conjunto, revelam a curiosidade incansável, a precisão histórica, a solidez política e o repúdio por categorizações fáceis – em suma, a inimitável inteligência de Sontag em pleno exercício.«É um deleite observar a agilidade da mente seccionando através da flacidez do pensamento preguiçoso.» The Washington Post«Uma nova compilação de primeiros textos de Sontag sobre género, sexualidade e feminismo.» Kirkus Reviews -
A Vida na SelvaHá quem nasça para o romance ou para a poesia e se torne conhecido pelo seu trabalho literário; e quem chegue a esse ponto depois de percorrer um longo caminho de vida, atravessando os escolhos e a complexidade de uma profissão, ou de uma passagem pela política, ou de um reconhecimento público que não está ligado à literatura. Foi o caso de Álvaro Laborinho Lúcio, que publicou o seu primeiro e inesperado romance (O Chamador) em 2014.Desde então, em leituras públicas, festivais, conferências e textos com destinos vários, tem feito uma viagem de que guarda memórias, opiniões, interesses, perguntas e respostas, perplexidades e reconhecimentos. Estes textos são o primeiro resumo de uma vida com a literatura – e o testemunho de um homem comprometido com as suas paixões e o diálogo com os outros. O resultado é comovente e tão inesperado como foi a publicação do primeiro romance. -
O Infinito num JuncoA Invenção do livro na antiguidade e o nascer da sede dos livros.Este é um livro sobre a história dos livros. Uma narrativa desse artefacto fascinante que inventámos para que as palavras pudessem viajar no tempo e no espaço. É o relato do seu nascimento, da sua evolução e das suas muitas formas ao longo de mais de 30 séculos: livros de fumo, de pedra, de argila, de papiro, de seda, de pele, de árvore, de plástico e, agora, de plástico e luz.É também um livro de viagens, com escalas nos campos de batalha de Alexandre, o Grande, na Villa dos Papiros horas antes da erupção do Vesúvio, nos palácios de Cleópatra, na cena do homicídio de Hipátia, nas primeiras livrarias conhecidas, nas celas dos escribas, nas fogueiras onde arderam os livros proibidos, nos gulag, na biblioteca de Sarajevo e num labirinto subterrâneo em Oxford no ano 2000.Este livro é também uma história íntima entrelaçada com evocações literárias, experiências pessoais e histórias antigas que nunca perdem a relevância: Heródoto e os factos alternativos, Aristófanes e os processos judiciais contra humoristas, Tito Lívio e o fenómeno dos fãs, Sulpícia e a voz literária de mulheres.Mas acima de tudo, é uma entusiasmante aventura coletiva, protagonizada por milhares de personagens que, ao longo do tempo, tornaram o livro possível e o ajudaram a transformar-se e evoluir – contadores de histórias, escribas, ilustradores e iluminadores, tradutores, alfarrabistas, professores, sábios, espiões, freiras e monjes, rebeldes, escravos e aventureiros.É com fluência, curiosidade e um permanente sentido de assombro que Irene Vallejo relata as peripécias deste objeto inverosímil que mantém vivas as nossas ideias, descobertas e sonhos. E, ao fazê-lo, conta também a nossa história de leitores ávidos, de todo o mundo, que mantemos o livro vivo.Um dos melhores livros do ano segundo os jornais El Mundo,La Vanguardia e The New York Times(Espanha). -
O Anticrítico«O Anticrítico» é uma compilação dos ensaios de Diogo Vaz Pinto — textos de crítica literária, e não só —, escritos entre 2014 e 2023, incluindo alguns inéditos. «Não tenho conta para as vezes todas em que, para ir com a rábula insultuosa que me tecem, pegando uns onde outros deixaram, numa cooperativa de imbecis que, sinceramente, me comove, já me quiseram tirar a condição que vem de tudo o que faço. Mais difícil seria desmontar alguma coisa. Resta que, ou ignoram muito vermelhuscos, ou a ideia é revogar-me a carta, licença, prostrar-me na indigência de eu ser uma qualquer abominação, «Bicho», monstro que ligam com tudo o que é baixo, e mesmo assim paira sobre eles sem explicação. Um Chernobyl encarnado. Crítico não sou. Ou só pseudo. Videirinho e jornaleiro, pilha-galinhas e o mais que eu coso bem ao meu estuporado currículo. Pois seja, eu fico então gordo disso tudo. E viro-me do avesso. Sou o anticrítico, então! Roubando esta de Augusto de Campos sem pudor. Há muito que não me retiram do sentido a ideia de que o principal é cortar com a impostura disto tudo. A gloríola da mediocridade, o sentido gregário, essa ratada ficção ligando os «egozinhos de porta-aberta» do nosso meio literato.» -
Terra QueimadaEnsaio profético e demolidor, TERRA QUEIMADA (2022) expõe a forma como o complexo internético se tornou «motor implacável de vício, solidão, falsas esperanças, crueldade, psicose, endividamento, vida desbaratada, corrosão da memória e desintegração social». Nele, Jonathan Crary faz uma crítica radical da digitalização do mundo e denuncia realidades inegáveis: a incompatibilidade entre um planeta habitável e a economia consumista e técnica, a atomização provocada pelas redes sociais, a era digital como fase terminal do capitalismo planetário. «Se é possível um futuro habitável e comum no nosso planeta», conclui, «esse futuro será offline, dissociado dos sistemas e da actividade do capitalismo 24/7, que destroem o mundo». -
Mário Cesariny e Antonio Tabucchi - Cartas e outros TextosFernando Cabral Martins: «O surrealismo português já tinha atingido no final dos anos sessenta uma definição que tornava possível, de um ponto de vista exterior, descomprometido, fazer uma avaliação de conjunto.» Antonio Tabucchi veio a Portugal no rasto de um poeta: Fernando Pessoa, ou melhor Álvaro de Campos, de quem lera por acaso o poema «Tabacaria». Quis aprender a língua do autor do poema e para isso inscreveu-se na cadeira de Língua e Literatura Portuguesa na Universidade de Pisa, que então frequentava. O seu mestre foi uma professora especial, bela, inteligente e culta, Luciana Stegagno Picchio. Antonio quis conhecer o país onde se falava aquela língua e ao qual pertencia aquele poeta e, na Primavera de 1965, com o seu Fiat 500, chegou a Portugal. Aí conheceu uma portuguesa com quem falou de Pessoa, e com quem continuou a trocar correspondência até ao ano seguinte, quando se tornaram namorados, vindo depois a casar (1970). Mas até lá, veio amiúde a Portugal […] e começou a interessar-se pelo Surrealismo português, sobre o qual havia muito pouco material crítico, praticamente nada, em vista da sua futura tese de licenciatura. Conheceu então (1967) dois membros ilustres daquele movimento, dois grandes poetas, Alexandre O’Neill e Mário Cesariny de Vasconcelos, com quem passou muitas horas, primeiro para os entrevistar e depois, com sempre maior intimidade, já com laços de amizade, só pelo prazer de estarem juntos. [Maria José de Lancastre] Esta é a história de um desencontro. Cesariny, como o surrealismo, considerava a universidade um inimigo, e Tabucchi, para todos os efeitos, era em 1971 um universitário. Mesmo se, no caso dele, havia por parte do poeta o agrado de ver como a sua poesia e o seu lugar no surrealismo português eram reconhecidos — pela primeira vez — por um leitor com a distância crítica e a óbvia inteligência de Antonio Tabucchi. Aqui, nos textos que documentam o contacto directo entre ambos do final dos anos 60, pode ver-se uma ilustração do modo como a história do surrealismo foi sendo feita, com que ritmo e a partir de que posições. E que implica a consciência, por parte do poeta, da importância do sentido que a crítica atribui à História, capaz (ou não) de tornar o passado digno do presente, ou vice- -versa. E manifesta, por parte do jovem crítico italiano, a intuição da grandeza de um movimento que evoluía na sombra, num carceral jardim à beira-mar. [Fernando Cabral Martins]
