Páginas de Doutrina e Crítica da Presença
Páginas de Doutrina e Crítica da Presença é um livro que reúne um conjunto de textos que José Régio foi publicando naquela revista, uma revista que marcou indelevelmente — e continua a marcar — a cultura portuguesa.
Este conjunto de textos versam os mais variados temas, desde a crítica cinematográfica (da qual José Régio foi um precursor), a crítica teatral, até à crítica de belas artes e de literatura.
Em todos estes textos está bem patente a acuidade analítica do autor, bem assim como a sua sensibilidade e a sua exigência crítica que não cede a compromissos fáceis.
| Editora | Opera Omnia |
|---|---|
| Coleção | Obras de José Régio |
| Categorias | |
| Editora | Opera Omnia |
| Negar Chronopost e Cobrança | Não |
| Autores | José Régio |
Poeta, autor dramático e ficcionista, de seu nome verdadeiro José Maria dos Reis Pereira, nasceu em 1901, em Vila do Conde, onde faleceu em 1969. Formou-se em Filologia Românica pela Faculdade de Letras de Coimbra, com uma tese de licenciatura subordinada ao título As Correntes e as Individualidades na Moderna Poesia Portuguesa, na qual ousa apresentar como nome cimeiro da poesia contemporânea Fernando Pessoa, autor que não possuía ainda nenhuma edição em livro. É em Coimbra que colabora com as publicações Bysancio e Tríptico, convivendo com o grupo de escritores que virão a reunir-se em torno da criação da revista Presença. No primeiro número da revista, fundada com João Gaspar Simões e Branquinho da Fonseca, publicará o texto "Literatura Viva", que pode ser entendido como manifesto programático do grupo, defendendo que "Em arte, é vivo tudo o que é original. É original tudo o que provém da parte mais virgem, mais verdadeira e mais íntima duma personalidade artística", pelo que, "A primeira condição duma obra viva é pois ter uma personalidade e obedecer-lhe". Definindo "literatura viva" como "aquela em que o artista insuflou a sua própria vida, e que por isso mesmo passa a viver de vida própria.", aí reclama, para a obra artística, o carácter de "documento humano" e os critérios de originalidade e sinceridade.
As linhas mestras da sua poética surgem claramente logo no seu primeiro livro de poesia (Poemas de Deus e do Diabo, 1925), no qual o culto da originalidade, entendida como autenticidade expressiva, se processa tematicamente entre os pólos do Bem e do Mal, do espírito e da carne, e, enfim, do divino e do humano. Neste contexto, os neo-realistas criticaram o psicologismo da sua poesia, que consideravam excessivamente voltada "para o umbigo".
Como autor dramático, José Régio coligiu, em 1940, no Primeiro Volume de Teatro, textos dramáticos (Três Máscaras, Jacob e o Anjo) publicados dispersamente desde os anos trinta, a que se seguiriam o drama realista Benilde ou a Virgem-Mãe (1947), uma peça que veio a ser adaptada ao cinema por Manoel de Oliveira, El-Rei Sebastião (1949), A Salvação do Mundo (1954), O Meu Caso ou Mário ou Eu-Próprio - O Outro (1957), peças que, em larga medida, estabelecem uma continuidade entre temas, problemáticas religiosas, humanas e metafísicas já abordadas na obra poética, transferindo o que esta possuía de forma latente em tensão dramática, patético e exibição emotiva para o registo teatral. É de destacar também O Jogo da Cabra-Cega (1934), um romance marcado pelo recurso à técnica do monólogo interior. Postumamente foram editadas as memórias Confissão de um Homem Religioso. Comparecendo ainda em publicações como Portucale, Cadernos de Poesia ou Távola Redonda, José Régio organizou vários florilégios de poetas diversos, redigiu estudos prefaciais para poetas da geração da Presença e preparou a primeira série das Líricas Portuguesas.
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Correspondência com Eugénio LisboaCorrespondência com Eugénio Lisboa exibe, sob a forma epistolar, a distinta amizade que uniu José Régio e Eugénio Lisboa sendo por inerência um exercício reflexivo sobre os grandes valores da vida, sobre a literatura e o seu processo de criação e, citando Eugénio Lisboa, sobre o «difícil equilíbrio entre o sonho e a disciplina necessária à construção de uma obra.» Com edição de Filipe Delfim Santos, este livro conta também com um prólogo de Eugénio Lisboa que contextualiza a história, a amizade, o tempo e o homem. «É esse acervo de cartas suas, a que junto as que lhe escrevi, que hoje aqui se fixa em livro, por me parecer de interesse humano e literário. Nele, Régio dá eminente testemunho da sua integridade, frontalidade, inteligência e sensibilidade.» Eugénio Lisboa -
Poemas de Deus e do DiaboO grande clássico de José Régio, obra maior da literatura portuguesa que integra, entre outros, a bandeira poética Cântico Negro. Com este livro de fine todo um programa de uma estética e assume-se como um dos mais incontornáveis autores do século XX. Esta edição inclui o importante posfácio Introdução a Uma Obra, conforme a última versão revista em vida do autor, e uma capa que recupera, num arranjo gráfico atual, a capa original de Júlio, da primeira edição, hoje uma raridade bibliográfica. -
Correspondência Familiar - Cartas a seus PaisDepois dos estudos feitos em Vila do Conde, José Maria dos Reis Pereira seguiu para o Porto, onde frequentou o Liceu Rodrigues de Freitas. Era uma ausência não muito significativa em termos geográficos, dada a proximidade com Vila do Conde. Não conhecemos cartas escritas a seus pais nessa época, o que não significa que não tenham existido. Mas a ida para Coimbra, onde frequentou a Faculdade de Letras da respectiva Universidade, representava uma ausência bem mais permanente, em que só as férias ou um ou outro feriado permitiriam o regresso a casa para matar saudades. Como alternativa, as cartas possibilitavam um diálogo que, sem as características presenciais, mitigavam as amarguras da ausência.Na sua globalidade, são documentos valiosos para compreendermos essa figura complexa e por vezes injustiçada que foi José Régio, devolvida, ao longo destas páginas, mais à sua condição de homem comum de filho e irmão do que à de grande escritor e intelectual assumido até às últimas consequências. -
Histórias de MulheresHistórias de Mulheres é uma coletânea de textos ficcionais (conto e novela) cujas personagens centrais são mulheres, o que desde logo confere a este livro uma identidade extraordinariamente original. Aqui encontramos, entre outras, as histórias de figuras como “Menina Olímpia e a sua Criada Belarmina” numa história de decadência social e física, a “História de Rosa Brava”, que nos apresenta uma jovem lésbica cujo temperamento rebelde choca com os valores da sua família, ou ainda “O Vestido Cor de Fogo”, história na qual um marido se vê oprimido pela sexualidade dominante da esposa." -
Jogo da Cabra CegaJogo da Cabra Cega, o primeiro romance de José Régio, é um livro singular na obra regiana, um livro que assinala o início do chamado segundo Modernismo, dando assim continuidade ao movimento literário iniciado com Pessoa e Mário de Sá-Carneiro.José Régio reconhece neste livro «um romance com uma intensidade quase frenética e quase desarrumada», sublinhando ainda a influência que Dostoievski exerceu sobre a sua escrita, dizendo: «À parte o ele ser um génio de primeira grandeza, com ele reconhecia profundas afinidades: sobretudo no seu turvo e fascinante misticismo, e no seu sublime debate entre o Bem e o Mal na alma do homem».Deste livro disse Jorge de Sena: "Jogo da Cabra Cega é um dos grandes romances portugueses deste século."Também Vergílio Ferreira se pronunciou, declarando: "Jogo da Cabra Cega - um dos três maiores livros de ficção deste século português (…), com Húmus e A Confissão de Lúcio."" -
Três Peças em Um AtoTrês Peças Em Um Ato revela-nos uma dimensão nem sempre suficientemente valorizada na obra de José Régio: o Teatro. José Régio, que desde cedo conviveu com as artes dramáticas, dedicou uma significativa parcela do seu labor literário ao género dramático, que tanto acarinhava, e que, sem dúvida, representa no conjunto da sua obra uma das vertentes mais modernas e mais expressivas.O presente volume inclui as peças Três Máscaras, O Meu Caso e Mário ou Eu Próprio – o Outro, trabalhos que estabelecem uma ligação com as temáticas profundas da obra regiana: a problemática metafísica, a tensão entre a autenticidade e o fingimento e a eterna interrogação sobre a condição humana." -
Nunca Vou Por Aí (Antologia Poética)No livro "Nunca vou por aí" (título tomado do famoso poema “Cântico Negro”), encontramos uma antologia da Poesia de José Régio, antologia que percorre a sua obra poética publicada em vida e também a que foi publicada postumamente. José Régio é um dos mais importantes e mais influentes poetas portugueses de sempre, e este livro mostra a força dessa poesia, uma poesia que continua no nosso imaginário e que ainda hoje é lida e recitada com emoção mesmo pelas gerações mais jovens. -
Poemas de Deus e do DiaboPoemas de Deus e do Diabo (primeiro livro de José Régio, onde podemos encontrar o famoso “Cântico Negro”), é um dos livros mais marcantes da Literatura Portuguesa, sendo mesmo considerado um clássico. Nesta estreia se anunciava um Autor que marcaria literariamente todo o Século XX português, com projeção para o Século XXI, tendo desde logo recebido grandes elogios. Para além de ser um extraordinário livro de Poesia, Poemas de Deus e do Diabo é também um programa de vida e uma afirmação estética. Esta edição inclui 8 desenhos do Autor, bem como o importantíssimo posfácio “Introdução a Uma Obra”. Esta edição está de acordo com a última versão revista em vida por José Régio." -
Histórias de MulheresNo universo ficcional das narrativas breves que enformam Histórias de Mulheres domina, naturalmente, a personagem feminina, que Régio, ao longo da sua produção literária e plástica, nunca desampara. Ei-la, ei-las - a mulher do século XX, a mulher do século XXI, a mulher atemporal - exímias e singularmente construídas inserindo-se, subtilmente, na díada individualidade / colectividade. Configuram aquilo a que Luís Piva chamou "monstruosidades", ligando-se não só ao espanto, ao horror, à estupefacção, como também ao conhecimento e ao paradoxo que erige a tensão luz / sombra, racional / irracional. A vida não se pode conhecer na totalidade; não é uma estrutura inteligível, mas sim única e obscura, imbricando logicidade e incoerência. Destarte, procedimentos particulares, peculiares, isolados, opõem-se ao social oco e vago dominado por um mundanismo inconsequente. A intencionalidade de Régio é de valorar e consagrar a mulher genuína, independente e quase rebelde, por contraste com a que integra a coletividade social, subjugada e coagida por complexos machistas. Não há aqui lugar ao chamado "sexo fraco", mas a demanda de uma identidade original valorizadora das potencialidades femininas. Dotada de uma densidade avassaladora, a psicologia destas personagens é intensa, egrégia, excepcional, pouco importando pechas e perversidades, porque, antes de mais, são prodígios humanos. A decadência social de Menina Olímpia, o lesbianismo de Rosa Brava, o sorriso triste de Dulce, a voluptuosidade de Maria Eugénia ou a paixão cega de Estefânia… "coisas miudinhas de mulheres - que lhes são tão importantes! e que a gente dificilmente pode compreender", torna-as únicas, mesmo se deambulando em geografias familiarmente apetecíveis. Independentes e com percursos autónomos, as Mulheres destas Histórias, enquanto personagens-provocação-redenção, perseguem uma sociedade justa sem prescindir do sagrado direito à loucura ou, se assim se preferir, à monstruosidade… São, afinal, seres humanos que, "sob as copas dos pinheiros ramalhando", aspiram à emancipação. Isabel Ponce de Leão -
BiografiaBiografia foi o segundo livro de José Régio, um livro que viria a confirmar o grande Poeta anunciado anteriormente em Poemas de Deus e do Diabo, primeiro livro do Autor. Este livro exclusivamente constituído por sonetos, ajudou a consagrar o nome do Poeta junto da crítica e do público, tendo conhecido várias edições ainda durante a vida do Autor. Como, de forma absolutamente certeira, disse Ruy Belo, “ a poética de José Régio apoia-se predominantemente na sensibilidade”. Esta edição inclui 6 desenhos de Júlio, celebrado artista plástico.
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Para Tão Curtos Amores, Tão Longa VidaNuma época e num país como o nosso, em que se regista um número muito elevado de divórcios, e em que muitos casais preferem «viver juntos» a casar-se, dando origem nas estatísticas a muitas crianças nascidas «fora do casamento», nesta época e neste país a pergunta mais próxima da realidade não é por que duram tão pouco tantos casamentos, mas antes: Por que é que há casamentos que duram até à morte dos cônjuges? Qual é o segredo? Há um segredo nisso? Este novo livro de Daniel Sampaio, que traz o título tão evocativo: Para Tão Curtos Amores, Tão Longa Vida, discute as relações afetivas breves e as prolongadas, a monogamia e a infidelidade, a importância da relação precoce com os pais e as vicissitudes do amor. Combinando dois estilos, o ficcional e o ensaístico, que domina na perfeição, o autor traz perante os nossos olhos, de modo muito transparente e sem preconceitos, tão abundantes nestas matérias, os problemas e dificuldades dos casais no mundo de hoje, as suas vitórias e derrotas na luta permanente para manterem viva a sua união.Um livro para todos nós porque (quase) todos nós, mais tarde ou mais cedo, passamos por isso. -
Sobre as MulheresSobre as Mulheres é uma amostra substancial da escrita de Susan Sontag em torno da questão da mulher. Ao longo dos sete ensaios e entrevistas (e de uma troca pública de argumentos), são abordados relevantes temas, como os desafios e a humilhação que as mulheres enfrentam à medida que envelhecem, a relação entre a luta pela libertação das mulheres e a luta de classes, a beleza, o feminismo, o fascismo, o cinema. Ao fim de cinquenta anos – datam dos primeiros anos da década de 1970 –, estes textos não envelheceram nem perderam pertinência. E, no seu conjunto, revelam a curiosidade incansável, a precisão histórica, a solidez política e o repúdio por categorizações fáceis – em suma, a inimitável inteligência de Sontag em pleno exercício.«É um deleite observar a agilidade da mente seccionando através da flacidez do pensamento preguiçoso.» The Washington Post«Uma nova compilação de primeiros textos de Sontag sobre género, sexualidade e feminismo.» Kirkus Reviews -
A Vida na SelvaHá quem nasça para o romance ou para a poesia e se torne conhecido pelo seu trabalho literário; e quem chegue a esse ponto depois de percorrer um longo caminho de vida, atravessando os escolhos e a complexidade de uma profissão, ou de uma passagem pela política, ou de um reconhecimento público que não está ligado à literatura. Foi o caso de Álvaro Laborinho Lúcio, que publicou o seu primeiro e inesperado romance (O Chamador) em 2014.Desde então, em leituras públicas, festivais, conferências e textos com destinos vários, tem feito uma viagem de que guarda memórias, opiniões, interesses, perguntas e respostas, perplexidades e reconhecimentos. Estes textos são o primeiro resumo de uma vida com a literatura – e o testemunho de um homem comprometido com as suas paixões e o diálogo com os outros. O resultado é comovente e tão inesperado como foi a publicação do primeiro romance. -
O Infinito num JuncoA Invenção do livro na antiguidade e o nascer da sede dos livros.Este é um livro sobre a história dos livros. Uma narrativa desse artefacto fascinante que inventámos para que as palavras pudessem viajar no tempo e no espaço. É o relato do seu nascimento, da sua evolução e das suas muitas formas ao longo de mais de 30 séculos: livros de fumo, de pedra, de argila, de papiro, de seda, de pele, de árvore, de plástico e, agora, de plástico e luz.É também um livro de viagens, com escalas nos campos de batalha de Alexandre, o Grande, na Villa dos Papiros horas antes da erupção do Vesúvio, nos palácios de Cleópatra, na cena do homicídio de Hipátia, nas primeiras livrarias conhecidas, nas celas dos escribas, nas fogueiras onde arderam os livros proibidos, nos gulag, na biblioteca de Sarajevo e num labirinto subterrâneo em Oxford no ano 2000.Este livro é também uma história íntima entrelaçada com evocações literárias, experiências pessoais e histórias antigas que nunca perdem a relevância: Heródoto e os factos alternativos, Aristófanes e os processos judiciais contra humoristas, Tito Lívio e o fenómeno dos fãs, Sulpícia e a voz literária de mulheres.Mas acima de tudo, é uma entusiasmante aventura coletiva, protagonizada por milhares de personagens que, ao longo do tempo, tornaram o livro possível e o ajudaram a transformar-se e evoluir – contadores de histórias, escribas, ilustradores e iluminadores, tradutores, alfarrabistas, professores, sábios, espiões, freiras e monjes, rebeldes, escravos e aventureiros.É com fluência, curiosidade e um permanente sentido de assombro que Irene Vallejo relata as peripécias deste objeto inverosímil que mantém vivas as nossas ideias, descobertas e sonhos. E, ao fazê-lo, conta também a nossa história de leitores ávidos, de todo o mundo, que mantemos o livro vivo.Um dos melhores livros do ano segundo os jornais El Mundo,La Vanguardia e The New York Times(Espanha). -
O Anticrítico«O Anticrítico» é uma compilação dos ensaios de Diogo Vaz Pinto — textos de crítica literária, e não só —, escritos entre 2014 e 2023, incluindo alguns inéditos. «Não tenho conta para as vezes todas em que, para ir com a rábula insultuosa que me tecem, pegando uns onde outros deixaram, numa cooperativa de imbecis que, sinceramente, me comove, já me quiseram tirar a condição que vem de tudo o que faço. Mais difícil seria desmontar alguma coisa. Resta que, ou ignoram muito vermelhuscos, ou a ideia é revogar-me a carta, licença, prostrar-me na indigência de eu ser uma qualquer abominação, «Bicho», monstro que ligam com tudo o que é baixo, e mesmo assim paira sobre eles sem explicação. Um Chernobyl encarnado. Crítico não sou. Ou só pseudo. Videirinho e jornaleiro, pilha-galinhas e o mais que eu coso bem ao meu estuporado currículo. Pois seja, eu fico então gordo disso tudo. E viro-me do avesso. Sou o anticrítico, então! Roubando esta de Augusto de Campos sem pudor. Há muito que não me retiram do sentido a ideia de que o principal é cortar com a impostura disto tudo. A gloríola da mediocridade, o sentido gregário, essa ratada ficção ligando os «egozinhos de porta-aberta» do nosso meio literato.» -
Terra QueimadaEnsaio profético e demolidor, TERRA QUEIMADA (2022) expõe a forma como o complexo internético se tornou «motor implacável de vício, solidão, falsas esperanças, crueldade, psicose, endividamento, vida desbaratada, corrosão da memória e desintegração social». Nele, Jonathan Crary faz uma crítica radical da digitalização do mundo e denuncia realidades inegáveis: a incompatibilidade entre um planeta habitável e a economia consumista e técnica, a atomização provocada pelas redes sociais, a era digital como fase terminal do capitalismo planetário. «Se é possível um futuro habitável e comum no nosso planeta», conclui, «esse futuro será offline, dissociado dos sistemas e da actividade do capitalismo 24/7, que destroem o mundo». -
Mário Cesariny e Antonio Tabucchi - Cartas e outros TextosFernando Cabral Martins: «O surrealismo português já tinha atingido no final dos anos sessenta uma definição que tornava possível, de um ponto de vista exterior, descomprometido, fazer uma avaliação de conjunto.» Antonio Tabucchi veio a Portugal no rasto de um poeta: Fernando Pessoa, ou melhor Álvaro de Campos, de quem lera por acaso o poema «Tabacaria». Quis aprender a língua do autor do poema e para isso inscreveu-se na cadeira de Língua e Literatura Portuguesa na Universidade de Pisa, que então frequentava. O seu mestre foi uma professora especial, bela, inteligente e culta, Luciana Stegagno Picchio. Antonio quis conhecer o país onde se falava aquela língua e ao qual pertencia aquele poeta e, na Primavera de 1965, com o seu Fiat 500, chegou a Portugal. Aí conheceu uma portuguesa com quem falou de Pessoa, e com quem continuou a trocar correspondência até ao ano seguinte, quando se tornaram namorados, vindo depois a casar (1970). Mas até lá, veio amiúde a Portugal […] e começou a interessar-se pelo Surrealismo português, sobre o qual havia muito pouco material crítico, praticamente nada, em vista da sua futura tese de licenciatura. Conheceu então (1967) dois membros ilustres daquele movimento, dois grandes poetas, Alexandre O’Neill e Mário Cesariny de Vasconcelos, com quem passou muitas horas, primeiro para os entrevistar e depois, com sempre maior intimidade, já com laços de amizade, só pelo prazer de estarem juntos. [Maria José de Lancastre] Esta é a história de um desencontro. Cesariny, como o surrealismo, considerava a universidade um inimigo, e Tabucchi, para todos os efeitos, era em 1971 um universitário. Mesmo se, no caso dele, havia por parte do poeta o agrado de ver como a sua poesia e o seu lugar no surrealismo português eram reconhecidos — pela primeira vez — por um leitor com a distância crítica e a óbvia inteligência de Antonio Tabucchi. Aqui, nos textos que documentam o contacto directo entre ambos do final dos anos 60, pode ver-se uma ilustração do modo como a história do surrealismo foi sendo feita, com que ritmo e a partir de que posições. E que implica a consciência, por parte do poeta, da importância do sentido que a crítica atribui à História, capaz (ou não) de tornar o passado digno do presente, ou vice- -versa. E manifesta, por parte do jovem crítico italiano, a intuição da grandeza de um movimento que evoluía na sombra, num carceral jardim à beira-mar. [Fernando Cabral Martins]
