O protagonista nasce na praia, como gosta de afirmar, e faz-se ao mundo em busca do sucesso que o compense das humilhações da infância, notabilizando-se como advogado do crime em processos mediáticos, volumosos, em cujos labirintos procura a prescrição dos crimes dos seus clientes de colarinho branco, a quem ternamente chama inocentes presumidos. A exposição mediática traz-lhe fama e proveito, mas na íngreme subida na escala social perde-se da mulher que conheceu um dia numa estação de comboios quando lia o “Cem Anos de Solidão”. Abrasa-o a ardente volúpia das paixões efémeras, vertigem sublime perante a morna rotina do casamento. Dilacera-o a culpa, com a dor do remorso, sem a redenção do arrependimento. Se voltasse atrás, faria tudo igual, porque, como gosta de dizer, as coisas são o que são. Confrontado, na vida como no tribunal, defende-se com alegações sem confissão nem arrependimento. Entre o casal, ergue-se um muro de silêncio e desconforto onde pulsa e se avoluma a memória de uma noite trágica de que não ousam falar. Para o demolir bastaria uma frase terna, impossível.
Os personagens dos contos de Insanus são vultos furtivos que frequentam insones a noite, confundem-se com as sombras que os perseguem e ensurdecem vozes interiores de censura e de culpa. Os diálogos nunca chegam a sê-lo. Não passam de monólogos com ecos, ressonâncias que se refletem, se repetem e se perdem nas arestas cortantes dos labirintos onde cada um consome a sua existência.Diz o velho ditado atribuído a um filósofo, que os que dançam são julgados insanos por aqueles que não podem escutar a música. O mesmo se passa com quem ouve vozes interiores inaudíveis para o resto do mundo. A insanidade de cada personagem é a errância solitária por caminhos que não escolheu, perante o olhar distante e indiferente de quem lhes poderia alterar os destinos.Há palavras e silêncios irrespiráveis, náufragos que se perdem no mar, que pode ser um deserto, um gato que regressa do passado, um mendigo invisível nos seus andrajos, estátuas que invadem uma pequena cidade termal, um surfista, alguns suicidas, uma mulher que tem o corpo do marido a apodrecer em casa, um pistoleiro sem nome, dois pregadores, um unicórnio e muitos outros personagens, todos eles numa revolta final e inútil contra o seu desolado criador.
D. João II morreu há quatro anos. Na Sé de Silves exuma-se o cadáver com vista à trasladação para o Mosteiro de Santa Maria da Vitória. Um sobressalto percorre os altos dignitários do reino: o corpo do monarca mantém-se incorrupto. "Milagre!", grita-se nas ruas. Peçonha, sugere um conceituado físico, que procura no envenenamento uma explicação para o não apodrecimento do corpo sem vida, descrente da santidade de um monarca implacável com os inimigos, que não hesitou em apunhalar o irmão da rainha.Desterrado no Mosteiro de Nossa Senhora da Misericórdia, na ilha da Berlenga, o narrador, que fez parte do corpo de ginetes, guarda pretoriana do rei, vive atormentado com a suspeita do envolvimento da rainha na morte solitária e precoce do soberano na única batalha por ele perdida: a da sua sucessão. Pela memória inquieta de quem viveu aqueles tempos, neste Príncipe Perfeito - Rei Pelicano, Coruja e Falcão desfila a vida conturbada de um rei que sonhou um reino para além do mar e das fronteiras daquele que herdou.
O protagonista nasce na praia, como gosta de afirmar, e faz-se ao mundo em busca do sucesso que o compense das humilhações da infância, notabilizando-se como advogado do crime em processos mediáticos, volumosos, em cujos labirintos procura a prescrição dos crimes dos seus clientes de colarinho branco, a quem ternamente chama inocentes presumidos.A exposição mediática traz-lhe fama e proveito, mas na íngreme subida na escala social perde-se da mulher que conheceu um dia numa estação de comboios quando lia o Cem Anos de Solidão.Abrasa-o a ardente volúpia das paixões efémeras, vertigem sublime perante a morna rotina do casamento. Dilacera-o a culpa, com a dor do remorso, sem a redenção do arrependimento. Se voltasse atrás, faria tudo igual, porque, como gosta de dizer, as coisas são o que são.Confrontado, na vida como no tribunal, defende-se com alegações sem confissão nem arrependimento.Entre o casal, ergue-se um muro de silêncio e desconforto onde pulsa e se avoluma a memória de uma noite trágica de que não ousam falar. Para o demolir bastaria uma frase terna, impossível.