Adriano
Os classicistas costumam passar tempo com os mortos. Um dos mortos com que devo ter passado mais tempo, ainda que intermitentemente, é capaz de ter sido o imperador Adriano. A minha obsessão por ele, no entanto, não tem muito a ver com a dignidade austera que nos ocorre quando pensamos nas estátuas de mármore branco (coloridas à época) da antiguidade clássica.
Foi na Livraria Bulhosa, em Entrecampos, que encontrei o primeiro exemplar que li de Memórias de Adriano. Lembro-me que Marguerite Yourcenar, que tal como Adriano tinha uma inteligência vasta e complicada como a extensão do império romano, transformou-se para mim, ao longo de alguns dias, nesse imperador do século II. Talvez tenha sido com ela que percebi, pela primeira vez, que não há melhor maneira de entender o mundo dos vivos do que reparar nele a partir do olhar dos mortos.
O objecto deste livro são alguns laços entre pessoas e também entre pessoas e lugares, bem como uma interrogação dos motivos pelos quais certas relações perseveram ou perecem. Certos poemas são uma observação de gente anónima que permanecerá perfeitamente desconhecida, como é o caso dos soldados no primeiro poema ou da massa de gente com que Vittorio Sereni se cruza no Pireu, no penúltimo texto do livro. Esta multidão, embora parte decisiva da paisagem de um poema desesperado da década de 40, continua a fazer-me pensar nos refugiados que chegam todos os dias a estações de comboio não só da Grécia como do resto da Europa. O passado deve ler-se aqui como uma coisa inexplicavelmente viva no presente, por vezes milagre e outras vezes castigo.
| Editora | não (edições) |
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| Coleção | Mutatis-mudandis |
| Categorias | |
| Editora | não (edições) |
| Negar Chronopost e Cobrança | Não |
| Autores | Tatiana Faia |
Tatiana Faia nasceu em 1986 (Portugal), e vive e trabalha em Oxford. Escreveu dois livros de poemas, Lugano (2011) e Teatro de Rua (2013), e um livro de contos, São Luís dos Portugueses em Chamas (2016). É doutorada em Estudos Clássicos, com uma tese sobre a Ilíada de Homero. Com José Pedro Moreira e André Simões editou a revista Ítaca: Cadernos de Ideias, Textos & Imagens (2009-2011). Actualmente é uma das editoras, com José Pedro Moreira, João Coles, Paulo Rodrigues Ferreira e Victor Gonçalves, da Enfermaria 6.
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Um Quarto em AtenasÀ COLECÇÃO DE POESIA DIRIGIDA POR PEDRO MEXIA CHEGA AGORA UMA DAS MAIS PROMISSORAS VOZES DA NOVA POESIA PORTUGUESA. A BALADA DE ANTOINE & FROSTYesperei pela chuvade chapéu postoquando eles se arrastaramlongamente pela linhacom o ímpeto com quemilhas e milhas de carruagens vaziasentraram na estaçãoestudei com cuidado e olhos míopese sem qualquer erudiçãoo horário em frente do meu narizsei que não estou vivadentro da função desta esperaa que ruy belo chamoutempo detergentee eu não considereicoisas óbviascomocomo é ser tuou o meu desprezopelos jogadoresou concessões dos meus amigosàs convenções sociaisa posições mais confortáveisempregos melhoresem termos de progressão de carreiraos gestos neutros de todos os diascomo se fossem um sentido
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Tal como És- Versos e Reversos do RyokanAntologia poética do monge budista Ryokan, com tradução a partir do original japonês. -
TisanasReedição das Tisanas de Ana Hatherly, poemas em prosa que ocuparam grande parte da vida da poeta e artista. -
NocturamaOs poemas são a exasperação sonhada As palavras são animais esquivos, imprecisos e noturnos. É desse pressuposto que Nocturama lança mão para descobrir de que sombras se densifica a linguagem: poemas que se desdobram num acordeão impressionante, para nos trazerem de forma bastante escura e às vezes irónica a suprema dúvida do real. -
Primeiros Trabalhos - 1970-19791970-1979 é uma selecção feita pela autora, da sua escrita durante esse mesmo período. Uma parte deste livro são trabalhos nunca publicados, onde constam excertos do seu diário, performances e notas pessoais. A maioria dos textos foram publicados ao longo da década de setenta, em livros que há muito se encontram esgotados, mesmo na língua original.“Éramos tão inocentes e perigosos como crianças a correr por um campo de minas.Alguns não conseguiram. A alguns apareceram-lhes mais campos traiçoeiros. E algunsparece que se saíram bem e viveram para recordar e celebrar os outros.Uma artista enverga o seu trabalho em vez das feridas. Aqui está então um vislumbredas dores da minha geração. Frequentemente bruto, irreverente—mas concretizado,posso assegurar, com um coração destemido.”-Patti SmithPrefácio de Rafaela JacintoTradução de cobramor -
Horácio - Poesia CompletaA obra de Horácio é uma das mais influentes na história da literatura e da cultura ocidentais. Esta é a sua versão definitiva em português.Horácio (65-8 a.C.) é, juntamente com Vergílio, o maior poeta da literatura latina. Pela variedade de vozes poéticas que ouvimos na sua obra, estamos perante um autor com muitos rostos: o Fernando Pessoa romano. Tanto a famosa Arte Poética como as diferentes coletâneas que Horácio compôs veiculam profundidade filosófica, mas também ironia, desprendimento e ambivalência. Seja na sexualidade franca (censurada em muitas edições anteriores) ou no lirismo requintado, este poeta lúcido e complexo deslumbra em todos os registos. A presente tradução anotada de Frederico Lourenço (com texto latino) é a primeira edição completa de Horácio a ser publicada em Portugal desde o século XVII. As anotações do professor da Universidade de Coimbra exploram as nuances, os intertextos e as entrelinhas da poética de Horácio, aduzindo sempre que possível paralelo de autores portugueses (com destaque natural para Luís de Camões e Ricardo Reis). -
Um Inconcebível AcasoNo ano em que se celebra o centenário de Wisława Szymborska, e coincidindo com a data do 23º aniversário da atribuição do prémio Nobel à autora, as Edições do Saguão e a tradutora Teresa Fernandes Swiatkiewicz apresentam uma antologia dos seus poemas autobiográficos. Para esta edição foram escolhidos vinte e seis poemas, divididos em três partes. Entre «o nada virado do avesso» e «o ser virado do avesso», a existência e a inexistência, nesta selecção são apresentados os elementos do que constituiu o trajecto e a oficina poética de Szymborska. Neles sobressai a importância do acaso na vida, o impacto da experiência da segunda grande guerra, e a condição do ofício do poeta do pós-guerra, que já não é um demiurgo e, sim, um operário da palavra que a custo trilha caminho. Nos poemas de Wisława Szymborska esse trajecto encontra sempre um destino realizado de forma desarmante entre contrastes de humor e tristeza, de dúvida e do meter à prova, de inteligência e da ingenuidade de uma criança, configurados num território poético de achados entregues ao leitor como uma notícia, por vezes um postal ilustrado, que nos chega de um lugar que sabemos existir, mas que muito poucos visitam e, menos ainda, nos podem dele dar conta. -
AlfabetoALFABET [Alfabeto], publicado em 1981, é a obra mais conhecida e traduzida de Inger Christensen.Trata-se de um longo poema sobre a fragilidade da natureza perante as ameaças humanas da guerra e da devastação ecológica. De modo a salientar a perfeição e a simplicidade de tudo o que existe, a autora decidiu estruturar a sua obra de acordo com a sequência de números inteiros de Fibonacci, que está na base de muitas das formas do mundo natural (como a geometria da pinha, do olho do girassol ou do interior de certas conchas). Como tal, Alfabeto apresenta catorze secções, desde a letra A à letra N, sendo que o número de versos de cada uma é sempre a soma do número de versos das duas secções anteriores. Ao longo destes capítulos, cada vez mais extensos, Christensen vai assim nomeando todas as coisas que compõem o mundo.Este livro, verdadeiramente genesíaco, é a primeira tradução integral para português de uma obra sua. -
Fronteira-Mátria - [Ou Como Chegamos Até Aqui]Sou fronteiradois lados de lugar qualquerum pé em cada território.O ser fronteiriço énascer&serde todo-lugar/ lugar-nenhum.(…)Todas as coisas primeiras são impossíveis de definir. Fronteira-Mátria é um livro que traz um oceano ao meio. Neste projeto original que une TERRA e MAZE, há que mergulhar fundo para ler além da superfície uma pulsão imensa de talento e instinto.Toda a criação é um exercício de resistência. Aqui se rimam as narrativas individuais, com as suas linguagens, seus manifestos, suas tribos, mas disparando flechas para lá das fronteiras da geografia, do território, das classes e regressando, uma e outra vez, à ancestral humanidade de uma história que é coletiva — a nossa. Veja-se a beleza e a plasticidade da língua portuguesa, a provar como este diálogo transatlântico é também a celebração necessária do que, na diferença, nos une.Todas as coisas surpreendentes são de transitória definição. Há que ler as ondas nas entrelinhas. Talvez o mais audacioso deste livro seja o servir de testemunho para muito mais do que as quatro mãos que o escrevem. Ficamos nós, leitores, sem saber onde terminam eles e começamos nós.Todas as coisas maravilhosas são difíceis de definir. Este é um livro para ouvir, sem sabermos se é poesia, se é música, se é missiva no vento. Se é uma oração antiga, ainda que nascida ainda agora pela voz de dois enormes nomes da cultura hip-hop de Portugal e do Brasil. Mátria carregada de futuro, anterior à escrita e à canção.Minês Castanheira