Derrubar Árvores - uma irritação
O carácter mais ou menos autobiográfico da obra narrativa de Thomas Bernhard já tem sido com frequência posto em relevo e não há dúvida de que os seus principais romances estão de maneira geral intimamente ligados à vida do escritor e revelam muito do seu carácter, das suas ideias, das suas vivências, do que foi, em suma, a sua própria vida, situando-se também a acção — se é que de acção se pode falar — em locais onde Bernhard viveu, com que estava familiarizado e cujos nomes por vezes são apenas ligeiramente alterados ou se mantêm na sua forma original.
Isso mesmo se verifica também em Derrubar Árvores (1984), mas com este romance passou-se algo de extraordinário, que atingiu as proporções de um enorme escândalo: o compositor Gerhard Lampersberg reconheceu-se na figura de Auersberger e, sentindo-se ofendido na sua dignidade, apresentou uma queixa que levou a que o livro, quando acabava de ser distribuído pelas livrarias, fosse apreendido por ordem do tribunal e o autor citado a comparecer em juízo. Profundamente indignado e revoltado, Thomas Bernhard proibiu a distribuição dos seus livros na Áustria durante todo o período de duração dos direitos de autor. No entanto, um dia antes do julgamento aprazado, Lampersberg retirou a queixa e o assunto foi encerrado, tendo Bernhard retirado igualmente a proibição da venda dos seus livros no país. Mas, como é sabido, o autor voltou a repetir essa proibição no seu testamento, aliás bastante agravada, pois se tratou nesse caso tanto da publicação de todas as suas obras, como também da representação das suas peças. Essa disposição testamentária foi de certo modo contornada pela criação da Fundação Particular Thomas Bernhard e pela acção do meio-irmão do escritor, Peter Fabjan, de modo que hoje Bernhard é apresentado e representado na Áustria quase sem restrições e geralmente reconhecido como um dos maiores nomes da literatura austríaca na segunda metade do século passado.
| Editora | Assírio & Alvim |
|---|---|
| Coleção | O Imaginário |
| Categorias | |
| Editora | Assírio & Alvim |
| Negar Chronopost e Cobrança | Não |
| Autores | Thomas Bernhard |
Niclaas Thomas Bernhard foi um escritor austríaco e é considerado um dos mais importantes escritores germanófonos da segunda metade do século XX. Deixou uma obra considerável que inclui 19 novelas, 17 peças e outros livros de carácter autobiográfico. Na sua obra, o humor mistura-se com o escárnio e o negativismo, traçando retratos impiedosos de uma sociedade onde há cada vez mais espaço para o pessimismo.
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O Sobrinho de WittgensteinThomas Bernhard, um dos escritores mais controversos e mais originais da moderna literatura austríaca, descreve nesta obra de carácter autobiográfico a sua relação de amizade com Paul Wittgenstein, um sobrinho do notável filósofo Ludwig Wittgenstein. O narrador passa em revista alguns dos episódios mais empolgantes ou impressivos dessa amizade e inicia o seu relato num momento repleto de significado, aquele em que ambos se encontram ocasionalmente internados no mesmo hospital de Viena, o narrador no serviço de doenças pulmonares e Paul na unidade de psiquiatria. Cada um levado, portanto, pela enfermidade que o acompanhou durante toda a vida: Thomas Bernhard sofria de uma doença pulmonar, que se foi agravando até à sua morte em 1989; Paul Wittgenstein, espírito brilhante, profundo conhecedor de música e apaixonado pela ópera, era com frequência atacado por perturbações mentais, que obrigavam ao seu internamento num hospital psiquiátrico. Ambos tinham, porém, em comum os interesses artísticos, o prazer da crítica, resultante da observação do mundo que os rodeava, a paixão das conversas de natureza filosófica. Paul, pertencente a uma das famílias mais ricas da Aústria, morreu na miséria, porque “deitou muitos milhões pela janela fora”. E a essa miséria juntou-se, nos seus últimos tempos, a decadência física, de tal modo que o narrador, como ele próprio confessa, já nem tinha coragem para o visitar, “com medo de ser directamente confrontado com a morte”. “Duzentos amigos irão ao meu enterro e tu tens de proferir um elogio fúnebre”, dissera um dia Paul ao amigo. Mas este, que não estava na Aústria quando ele morreu, nem sequer ainda foi, diz no final, “ver a sua sepultura”. O Sobrinho de Wittgensteiné uma narrativa de grande humanidade, mas ao mesmo tempo plena de ironia, de humor e salpicada de episódios jocosos ou grotescos, aos quais não faltam a crítica acesa e o desassombro provocatório ou sarcástico, no melhor estilo de Thomas Bernhard. -
Antigos Mestres“Bernhard é considerado hoje uma das figuras mais relevantes da literatura de língua alemã na segunda metade do século XX. Ainda há relativamente pouco tempo o famoso crítico alemão Marcel Reich-Ranicki dizia, num livro constituído por entrevistas sobre vários autores, o seguinte: "Se me perguntassem quais foram os três maiores talentos da literatura alemã, no domínio da prosa, depois de 1945 (…) eu indicaria decerto três nomes: Wolfgang Koeppen, Günter Grass, Thomas Bernhard. São as três mais fortes energias épicas na nova prosa alemã. Considero, portanto, Thomas Bernhard um dos verdadeiramente grandes".” José A. Palma Caetano, na introdução deste livro. -
O Fazedor de TeatroO Fazedor de Teatro é uma das peças de Thomas Bernhard que até hoje mais êxito alcançaram e mais representadas tê sido. Pertence já à fase de "maturidade dramática" do autor, pois foi escrita na primeira metade dos anos oitenta, publicada em 1984 e estreada no ano seguinte. Uma das reflexões fundamentais, se não a reflexão fundamental a que esta peça e especialmente a figura de Bruscon - a personagem principal - nos conduzem é o absurdo que em tantos actos humanos se contém, e que, no fundo, caracteriza toda a existência humana. Poderíamos falar mesmo de uma denuncia do absurdo, que, aliás se encontra não apenas nesta peça, mas em toda a obra de Thomas Bernhard. O absurdo não ó da realidade "fingida" que é o teatro, mas também da existência real a que, no fundo, o teatro serve de espelho, ainda que frequentemente distorcido. E as seguintes palavras proferidas por Bruscon podem, sem dúvida, ser tomadas não apenas como teatro ou literatura, mas como expressão da realidade: Efectivamente servimos toda a vida/ o absurdo/ de ter nascido/ Fatal construção do mundo. -
Extinção"Extinção é não só o último romance publicado por Thomas Bernhard — embora não tenha sido provavelmente o último a ser concebido e escrito —, mas também o mais longo e aquele em que se concentram, de uma forma mais depurada e mais límpida, as ideias fundamentais do famoso escritor austríaco e se desenha com maior perfeição a sua estética literária. É assim uma espécie de cúpula do edifício de prosa narrativa por ele construído ao longo dos anos — em grande parte atormentados pela doença — da sua relativamente breve existência (1931-1989) e que constitui a parte fundamental da sua obra.A temática de Extinção gira em torno de um palácio, Wolfsegg, centro de uma grande propriedade agrícola, e de uma família, a do narrador, Franz-Josef Murau, que das suas "origens" se afastou, para ir viver em Roma. Com a morte dos pais e do irmão num acidente de automóvel, cabe-lhe em herança Wolfsegg, de que ele acaba por fazer doação à Comunidade Israelita de Viena, uma alusão à reparação devida aos judeus depois do holocausto do período nazi. O “complexo das origens”, um aspecto fundamental da vida e da obra de Bernhard, situa-se também na base deste romance. Só através da “extinção” da família e da propriedade o narrador se pode verdadeiramente encontrar consigo próprio. Esta ideia aplica-se igualmente ao nosso mundo, que só será possível mudar através da sua destruição total ou quase total, “para depois o reconstruirmos (…) como um mundo completamente novo”.O radicalismo do pensamento de Bernhard, que ele próprio reconhece, classificando-se de “artista do exagero”, exprime-se aqui em toda a originalidade da sua prosa, cuja estrutura musical se revela em Extinção extremamente apurada e a essa prosa transmite, mesmo no que ela às vezes parece ter de monótona, um ritmo insinuante e uma estranha fascinação."José A. Palma Caetano -
O NáufragoNeste seu livro, Thomas Bernhard fala da morte. A do músico Gould e a de Wertheimer, igualmente músico, que se suicidou. O narrador é o único que abandonou a música, oferecendo o piano à filha de um professor de província, quando compreendeu que nunca poderia igualar Glenn Gould. -
Autobiografia«É certo que os cinco livros da «Autobiografia» ["A Causa" (1975), "A Cave" (1976), "A Respiração" (1978), "O Frio" (1981) e "Uma Criança" (1982)] servem a Bernhard para dar a conhecer o que foi a sua infância e a sua juventude, mas sempre na medida em que esses períodos da sua vida e os acontecimentos por ele narrados foram relevantes para a sua obra literária. O escritor enfatiza os momentos que o marcaram para o resto da existência, faz notar os seus problemas, os seus erros, as fraquezas e os aspectos contraditórios do seu carácter, mas também as suas grandes decisões, a sua independência, a sua força de vontade, a sua natureza insubmissa e inconformada, mesmo na luta pela própria vida. [ ] ficção e biografia interpenetram-se em Bernhard de uma forma nem sempre clara, porque ambas participam igualmente da sua escrita enquanto obra de arte e ambas se completam e explicam reciprocamente. [ ] Na verdade, esse período da infância e juventudee a ele se limita a Autobiografiainfluencia decisivamente a personalidade do escritor, modela o seu carácter e de certo modo constrói as bases da sua carreira literária. Pode-se mesmo dizer que, sem conhecer as suas origens, as circunstâncias em que se verificou o seu nascimento, o que ele foi em criança e as provações por que passou na adolescência, não será fácil compreender devidamente a sua obra.»José A. Palma Caetano, Introdução. -
BetãoAo fim de dez anos de investigação, Rudolf, um musicólogo vienense, senta-se para escrever a biografia de Mendelssohn Bartholdy. Perante um bloqueio de escrita, acaba por produzir um relato sombrio e grotescamente caricato do que o rodeia, dos seus pensamentos, temores profundos e distrações. Conhecemos o amor e o ódio que nutre por quem o rodeia, a doença que suspeita ter e, finalmente, a sua fuga, que acaba por se cruzar com a narrativa de terror muito real de outra pessoa. Uma história magnífica sobre a procrastinação, o fracasso e o desespero. Uma obra irónica e densa, na qual o absurdo e o seu sentido se entrelaçam com o quotidiano de um homem dilacerado por sentimentos contraditórios. -
BetãoAo fim de dez anos de investigação, Rudolf, um musicólogo vienense, senta-se para escrever a biografia de Mendelssohn Bartholdy. Perante um bloqueio de escrita, acaba por produzir um relato sombrio e grotescamente caricato do que o rodeia, dos seus pensamentos, temores profundos e distrações. Conhecemos o amor e o ódio que nutre por quem o rodeia, a doença que suspeita ter e, finalmente, a sua fuga, que acaba por se cruzar com a narrativa de terror muito real de outra pessoa. Uma história magnífica sobre a procrastinação, o fracasso e o desespero. Uma obra irónica e densa, na qual o absurdo e o seu sentido se entrelaçam com o quotidiano de um homem dilacerado por sentimentos contraditórios. -
GeadaRelato de surpreendente robustez e de latente lirismo, Geada (1963) representou a revelação de Thomas Bernhard como um dos grandes escritores do século XX. Um perturbante e isolado vale austríaco, camuflado por uma geada permanente, e a ligação de um estudante de medicina a um pintor aí recolhido há vinte anos numa incessante degradação mental, são os bastidores que sustentam as observações e reflexões sobre a morte, a solidão, a velhice, a educação, a arte e a pobreza (da condição humana, de espírito), que vão percorrendo o romance, e que, aparentemente desconexas entre si, formam um sistema coerente que se confronta permanentemente com a nossa incapacidade de submeter o mundo a um processo de racionalização. Em Geada, está ausente uma intenção deliberada de contar uma história. O estudante escuta o pintor, que vai expondo as suas reflexões e observações sobre as suas dores físicas e existenciais em constante diálogo com o que o rodeia. Quanto à história, tem o leitor de a ir concebendo por si, à medida que os pensamentos dos dois personagens nos vão chegando.Este é o romance inaugural de uma voz particular e inconfundível da literatura. Porém, até chegar a ele, durante dez anos, Bernhard escreveu vários romances de centenas de páginas que nunca chegou a mostrar, por considerar o resultado final pouco interessante. No caso de Geada, «tive mesmo a sensação, quando terminei, de que isso era qualquer coisa que realmente ainda ninguém tinha feito, e também que ninguém imitaria». «Eu nunca pensei na forma, ela surgiu espontaneamente, segundo o que eu sou e escrevo. Nós temos, claro, modelos e histórias. Mas creio que, antes do romance Geada, no fundo não havia realmente nada do género. Foi a primeira vez que desse modo se escreveu» (Kurt Hofmann, Em Conversa com Thomas Bernhard, Assírio e Alvim, 2006, pp. 51, 29).
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O Essencial Sobre José Saramago«Aquilo que neste livro se entende como essencial em José Saramago corresponde à sua específica identidade como escritor, com a singularidade e com as propriedades que o diferenciam, nos seus fundamentos e manifestações. Mas isso não é tudo. No autor de Memorial do Convento afirma-se também uma condição de cidadão e de homem político, pensando o seu tempo e os fenómenos sociais e culturais que o conformam. Para o que aqui importa, isso é igualmente essencial em Saramago, até porque aquela condição de cidadão não é estranha às obras literárias com as quais ela interage, em termos muito expressivos.» in Contracapa -
Confissões de um Jovem EscritorUmberto Eco publicou seu primeiro romance, O Nome da Rosa, em 1980, quando tinha quase 50 anos. Nestas suas Confissões, escritas cerca de trinta anos depois da sua estreia na ficção, o brilhante intelectual italiano percorre a sua longa carreira como ensaísta dedicando especial atenção ao labor criativo que consagrou aos romances que o aclamaram. De forma simultaneamente divertida e séria, com o brilhantismo de sempre, Umberto Eco explora temas como a fronteira entre a ficção e a não-ficção, a ambiguidade que o escritor mantém para que seus leitores se sintam livres para seguir o seu próprio caminho interpre tativo, bem como a capacidade de gerar neles emoções. Composto por quatro conferências integradas no âmbito das palestras Richard Ellmann sobre Literatura Moderna que Eco proferiu na Universidade Emory, em Atlanta, nos Estados Unidos, Confissões de um jovem escritor é uma viagem irresistível aos mundos imaginários do autor e ao modo como os transformou em histórias inesquecíveis para todos os leitores. O “jovem escritor” revela-se, afinal, um grande mestre e aqui partilha a sua sabedoria sobre a arte da imaginação e o poder das palavras. -
Sobre as MulheresSobre as Mulheres é uma amostra substancial da escrita de Susan Sontag em torno da questão da mulher. Ao longo dos sete ensaios e entrevistas (e de uma troca pública de argumentos), são abordados relevantes temas, como os desafios e a humilhação que as mulheres enfrentam à medida que envelhecem, a relação entre a luta pela libertação das mulheres e a luta de classes, a beleza, o feminismo, o fascismo, o cinema. Ao fim de cinquenta anos – datam dos primeiros anos da década de 1970 –, estes textos não envelheceram nem perderam pertinência. E, no seu conjunto, revelam a curiosidade incansável, a precisão histórica, a solidez política e o repúdio por categorizações fáceis – em suma, a inimitável inteligência de Sontag em pleno exercício.«É um deleite observar a agilidade da mente seccionando através da flacidez do pensamento preguiçoso.» The Washington Post«Uma nova compilação de primeiros textos de Sontag sobre género, sexualidade e feminismo.» Kirkus Reviews -
Para Tão Curtos Amores, Tão Longa VidaNuma época e num país como o nosso, em que se regista um número muito elevado de divórcios, e em que muitos casais preferem «viver juntos» a casar-se, dando origem nas estatísticas a muitas crianças nascidas «fora do casamento», nesta época e neste país a pergunta mais próxima da realidade não é por que duram tão pouco tantos casamentos, mas antes: Por que é que há casamentos que duram até à morte dos cônjuges? Qual é o segredo? Há um segredo nisso? Este novo livro de Daniel Sampaio, que traz o título tão evocativo: Para Tão Curtos Amores, Tão Longa Vida, discute as relações afetivas breves e as prolongadas, a monogamia e a infidelidade, a importância da relação precoce com os pais e as vicissitudes do amor. Combinando dois estilos, o ficcional e o ensaístico, que domina na perfeição, o autor traz perante os nossos olhos, de modo muito transparente e sem preconceitos, tão abundantes nestas matérias, os problemas e dificuldades dos casais no mundo de hoje, as suas vitórias e derrotas na luta permanente para manterem viva a sua união.Um livro para todos nós porque (quase) todos nós, mais tarde ou mais cedo, passamos por isso. -
A Vida na SelvaHá quem nasça para o romance ou para a poesia e se torne conhecido pelo seu trabalho literário; e quem chegue a esse ponto depois de percorrer um longo caminho de vida, atravessando os escolhos e a complexidade de uma profissão, ou de uma passagem pela política, ou de um reconhecimento público que não está ligado à literatura. Foi o caso de Álvaro Laborinho Lúcio, que publicou o seu primeiro e inesperado romance (O Chamador) em 2014.Desde então, em leituras públicas, festivais, conferências e textos com destinos vários, tem feito uma viagem de que guarda memórias, opiniões, interesses, perguntas e respostas, perplexidades e reconhecimentos. Estes textos são o primeiro resumo de uma vida com a literatura – e o testemunho de um homem comprometido com as suas paixões e o diálogo com os outros. O resultado é comovente e tão inesperado como foi a publicação do primeiro romance. -
Almoço de DomingoUm romance, uma biografia, uma leitura de Portugal e das várias gerações portuguesas entre 1931 e 2021. Tudo olhado a partir de uma geografia e de uma família.Com este novo romance de José Luís Peixoto acompanhamos, entre 1931 e 2021, a biografia de um homem famoso que o leitor há de identificar — em paralelo com história do país durante esses anos. No Alentejo da raia, o contrabando é a resistência perante a pobreza, tal como é a metáfora das múltiplas e imprecisas fronteiras que rodeiam a existência e a literatura. Através dessa entrada, chega-se muito longe, sem nunca esquecer as origens. Num percurso de várias gerações, tocado pela Guerra Civil de Espanha, pelo 25 de abril, por figuras como Marcelo Caetano ou Mário Soares e Felipe González, este é também um romance sobre a idade, sobre a vida contra a morte, sobre o amor profundo e ancestral de uma família reunida, em torno do patriarca, no seu almoço de domingo.«O passado tem de provar constantemente que existiu. Aquilo que foi esquecido e o que não existiu ocupam o mesmo lugar. Há muita realidade a passear-se por aí, frágil, transportada apenas por uma única pessoa. Se esse indivíduo desaparecer, toda essa realidade desaparece sem apelo, não existe meio de recuperá-la, é como se não tivesse existido.» «Os motoristas estão à espera, o brado da multidão mistura-se com o rugido dos motores. Antes de entrarmos, o Mário Soares aproxima-se de mim, correu tudo tão bem, e abraça-me com um par estrondosas palmadas no centro das costas. A coluna de carros avança devagar pelas ruas da vila. Tenho a garganta apertada, não consigo falar. Como me orgulha que Campo Maior seja a capital da península durante este momento.»«Autobiografia é um romance que desafia o leitor ao diluir fronteiras entre o real e o ficcional, entre espaços e tempos, entre duas personagens de nome José, um jovem escritor e José Saramago. Este é o melhor romance de José Luís Peixoto.»José Riço Direitinho, Público «O principal risco de Autobiografia era esgotar-se no plano da mera homenagem engenhosa, mas Peixoto evitou essa armadilha, ao construir uma narrativa que se expande em várias direções, acumulando camadas de complexidade.»José Mário Silva, Expresso -
Electra Nº 23A Atenção, tema de que se ocupa o dossier central do número 23 da revista Electra, é um recurso escasso e precioso e por isso objecto de uma guerra de concorrência sem tréguas para conseguir a sua captura. Nunca houve uma tão grande proliferação de informação, de produtos de consumo, de bens culturais, de acontecimentos que reclamam a atenção. Ela é a mercadoria da qual depende o valor de todas as mercadorias, sejam materiais ou imateriais, reais ou simbólicas. A Atenção é, pois, uma questão fundamental do nosso tempo e é um tópico crucial para o compreendermos. Sobre ela destacam-se neste dossier artigos e entrevistas de Yves Citton, Enrico Campo, Mark Wigley, Georg Franck e Claire Bishop. Nesta edição, na secção “Primeira Pessoa”, são publicadas entrevistas à escritora, professora e crítica norte-americana Svetlana Alpers (por Afonso Dias Ramos), cujo trabalho pioneiro redefiniu o campo da história da arte nas últimas décadas, e a Philippe Descola (por António Guerreiro), figura central da Antropologia, que nos fala de temas que vão desde a produção de imagens e das tradições e dos estilos iconográficos à questão da oposição entre natureza e cultura. A secção “Furo” apresenta um conjunto de desenhos e cartas inéditos da pintora Maria Helena Vieira da Silva. Em 1928, tinha vinte anos. Havia saído de Portugal para estudar arte em Paris e, de França, foi a Itália numa viagem de estudo. Durante esse percurso desenhou num caderno esboços rápidos do que via, e ao mesmo tempo, escrevia cartas à mãe para lhe contar as suas impressões e descobertas. Uma selecção destes desenhos e destas cartas, que estabelecem entre si um diálogo íntimo e consonante, é agora revelada. Na Electra 23, é publicada, na secção “Figura”, um retrato do grande poeta grego Konstandinos Kavafis, feito pelo professor e tradutor Nikos Pratsinis, a partir de oito perguntas capitais; é comentada, pelo escritor Christian Salmon, na secção “Passagens”, uma reflexão sobre a história trágica da Europa Central do consagrado romancista e ensaísta checo, Milan Kundera. Ainda neste número, o ensaísta e jornalista Sergio Molino dá-nos um mapa pessoal da cidade de Saragoça, em que a história e a geografia, a literatura e a arte se encontram; o jornalista e colunista brasileiro Marcelo Leite trata das investigações em curso desde os anos 90, com vista ao uso farmacológico e terapêutico dos psicadélicos; a escritora e veterinária María Sanchez constrói um diário que é atravessado por procuras e encontros, casas e viagens, livros e animais, terras e mulheres, amor e amizade; o arquitecto, investigador e curador chileno Francisco Díaz aborda a relação entre solo e terreno, a partir do projecto da Cidade da Cultura de Santiago de Compostela, da autoria de Peter Eisenman; o artista e ensaísta João Sousa Cardoso escreve sobre a obra do escultor Rui Chafes, revisitando três exposições e um livro apresentados durante o ano de 2023; e o dramaturgo Miguel Castro Caldas comenta a palavra “Confortável”.Vários -
Diário SelvagemEste «Diário Selvagem», «até aqui quase integralmente inédito, é um livro mítico, listado e discutido em inúmeras cartas e cronologias do autor, a que só alguns biógrafos e estudiosos foram tendo acesso».
