Um dos 45 poemas do livro:

" - A raiva em mim

O meu coração é uma sala escura e vazia
Onde só passeiam aranhas nas suas redes
E onde, feito louco, corto uma esperança doentia
E, com o sangue, escrevo vários nomes nas paredes.

Mas abre-se, por vezes, uma porta por onde saio
E vejo que existe um espaço na alma com claridade.
Vem então esta maneira de ver as coisas e eu caio,
Como se estivesse em overdose de irracionalidade.

Surge a raiva em mim nesta espécie de perpétua solidão.
Cresce aqui invisível, como o mal incorpóreo de um quisto.
Uns dias tenho olhos que veem para tudo uma solução,
Noutros, a raiva em mim cega-me, eu farto-me e desisto!

Num bloco de notas mental anoto cada conselho…
Vou errando e digo para mim mesmo: “Nunca mais!”
Mas vem a raiva em mim, como um tipo de espelho
Cheio de reflexos coloridos, mas todos – todos! – iguais!

Neste estado bipolar, penso na vida quando estou sozinho…
Uns dias penso que tenho tudo para fazer o que me apeteça,
E que consigo construir um castelo com as pedras do caminho,
Mas noutros penso: “Tu estás é muito doente dessa cabeça!”

Porque prefiro viver feliz na ilusão que criei só para mim
Do que viver na realidade daquilo que não me pertence?
Viver neste estado é como viver numa guerra sem fim
Onde a razão luta com a insanidade, mas ninguém vence.

Eu sinto esta guerra como uma eterna doença.
Sinto esta raiva por ser assim, ou por não perceberem.
Sinto-me preso em mim com pena suspensa,
E com a realidade sinto a raiva e o ódio crescerem!

Esta agressividade tão directa!
Este veneno em forma de ódio!
A raiva por mim é tão incerta!
Faz-me ser louco, faz-me tão sóbrio!

A raiva em mim…
A raiva em mim vai crescendo e crescendo…
Solto uma gargalhada e esmurro as paredes!
Risco os nomes que fui escrevendo!

A raiva em mim só cresce…
É a força que me faz avançar!
E faz-me querer – mas não queria! – ser frio!
Esta raiva não mata, mas mói!
A raiva em mim só cresce…
Cresce! Cresce! Cresce!
E – puta que a pariu!
É só a mim que destrói!"