O Avesso da Tapeçaria
Livro em estreia mundial: Uma declaração de amor do bibliófilo Alberto Manguel aos tradutores e à tradução. A reencarnação de um texto em palavras que não são as originais é talvez uma das maiores provas do poder criativo do leitor. A tradução é a mais profunda e elevada forma de leitura. Penetrar num texto, desmontá‑lo, reconstruí‑lo com palavras e frases que obedecem às normas de outros ouvidos e de outros olhos é dar uma nova vida a esse texto, agora mais consciente das suas costuras e da sua dívida ao acaso e ao prazer. É por isso que escolho aqui falar da tradução em fragmentos que o próprio original desconsidera, ou rejeita, ou dos quais se envergonha — tudo aquilo que fica exposto (como Dom Quixote diz) no caótico avesso de uma tapeçaria. — Alberto Manguel «Até bastante tarde na minha infância, não soube que existia uma coisa chamada tradução. Fui criado por uma ama checa, em inglês e alemão, e aprendi espanhol já com oito ou nove anos. Ao longo da infância, usei as minhas primeiras línguas indiscriminadamente, sem privilegiar uma em detrimento da outra, e nunca pensei nelas como reinos isolados com fronteiras rígidas que tivesse de atravessar. Para mim, a linguagem era uma espécie de Babel convivial constituída por vários conjuntos de palavras, diferentes em som e peso, mas semelhantes em sentido e valor. Só me apercebi de que não era assim para toda a gente quando um dia, na escola, sentindo‑me inseguro no meu espanhol, falei com a professora argentina em inglês e recebi uma severa repreensão. Foi assim que aprendi que existiam fronteiras linguísticas e que eu tinha de as respeitar. Nunca o consegui fazer.»
| Editora | Tinta da China |
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| Categorias | |
| Editora | Tinta da China |
| Negar Chronopost e Cobrança | Não |
| Autores | Alberto Manguel |
Alberto Manguel (1948, Buenos Aires) cresceu em Telavive e na Argentina. Aos 16 anos, trabalhava na livraria Pygmalion, em Buenos Aires, quando Jorge Luis Borges lhe pediu que lesse para ele em sua casa. Foi leitor de Borges entre 1964 e 1968. Em 1968, mudou‑se para a Europa. Viveu em Espanha, França, Itália e Inglaterra, ganhando a vida como leitor e tradutor para várias editoras. Editou cerca de uma dezena de antologias de contos sobre temas tão díspares como o fantástico ou a literatura erótica. É ensaísta, romancista premiado e autor de vários best‑sellers internacionais, como Dicionário de Lugares Imaginários, Uma História da Curiosidade, A Biblioteca à Noite e Embalando a Minha Biblioteca. É actualmente cidadão canadiano e foi director da Biblioteca Nacional da Argentina entre 2016 e 2018. Foi galardoado com o Prémio Formentor das Letras em 2017.
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Uma História da LeituraUma notável e fascinante viagem pela evolução do leitor e da leitura numa obra que vem colmatar uma lacuna na história da literatura internacional. Um sucesso editorial surpreendente da autoria de um nome que se tem destacado nas áreas do romance, da tradução e da edição. -
O Amante Extremamente MinuciosoÀ sombra da igreja de Notre-Dame-la-Grande, em Poitiers, desenvolve-se a fatal aventura estética e amorosa de Anatole Vasanpeine, empregado nuns banhos públicos no início do século XX.Indivíduo cinzento e silencioso, Anatole oculta uma capacidade extraordinária: iniciado na arte da fotografia pelo livreiro e antiquário japonês Kusakabe, o seu olhar capta a realidade em fragmentos, oferecendo ao desejo o prazer que lhe nega a integralidade da imagem. Nas imagens roubadas dos clientes dos banhos, Anatole reconstrói uma geografia do amor: dedos arredondados, pele aveludada, a caverna de uma orelha... Nas suas fotografias, cada criatura torna-se um conjunto infinito de belezas mínimas até ao momento em que, inesperadamente, Anatole encontra a perfeição numa única pessoa.Com zelo de historiador e malícia de ficcionista, em O Amante Extremamente Minucioso Alberto Manguel reconstrói o caso Vasanpeine, deixando aos leitores a tarefa de distinguir entre uma ficção mais credível do que a realidade e uma realidade menos plausível do que a ficção -
A Cidade das PalavrasEm A Cidade das Palavras, Alberto Manguel analisa a uma nova luz o aumento da intolerância violenta nas nossas sociedades. Quase todos nós concordamos quanto à desejabilidade do fim do nacionalismo étnico. Esforçamo-nos por construir sociedades que promovam o patriotismo cívico, com valores nos quais todos os cidadãos se revejam. Mas algo não correu bem: revoltas racistas em França, assassínio político nos Países Baixos, atentados bombistas no Reino Unido - serão estes os sintomas de uma experiência multicultural mal-sucedida? Porque nos é tão difícil vivermos juntos, quando as alternativas são verificadamente horríveis? Com a erudição e o espírito que o caracterizam, Alberto Manguel propõe uma abordagem diferente: devemos ouvir o que visionários, poetas, romancistas, ensaístas e realizadores de cinema têm a dizer sobre construção de sociedades. Talvez as histórias que contamos encerrem as chaves secretas do coração humano. De Cassandra a Jack London, da Epopeia de Gilgamesh ao computador Halde 2001: Odisseia no Espaço, Alberto Manguel estabelece paralelos fascinantes e reveladores entre as realidades individuais e políticas do mundo actual e as realidades do mito, da lenda e da história. -
Uma História da CuriosidadeO livro mais pessoal de Alberto Manguel, onde o escritor traça o mapa da sua própria vida enquanto curioso, recorrendo às leituras que fez ao longo do caminho. Uma História da Curiosidade é uma eloquente mistura de filosofia, literatura e memória. Arranca com a premissa de que a curiosidade é um impulso que liga aprendizagem, imaginação, desenvolvimento e progresso. Na procura de pistas e orientação, o autor recorre ao extenso conjunto de livros que marcaram a sua própria vida. Manguel elegeu para este livro uma série de escritores que instigaram a sua imaginação. Cada capítulo é dedicado a um pensador, cientista ou artista que de algum modo iluminou a pergunta Porquê? Desta galeria de eternos curiosos constam, por exemplo, Tomás de Aquino, David Hume, Lewis Carroll, Sócrates e, acima de todos, Dante. Depois de tudo o que leu e pensou, Manguel pretende inaugurar um diálogo. A curiosidade não é o fim, é o passaporte, o convite para viajar. -
A Biblioteca à NoiteA partir da sua mítica biblioteca pessoal, Alberto Manguel, um dos mais conceituados bibliófilos do mundo, conta-nos tudo o que sabe sobre a história, o fascínio e os enigmas das bibliotecas. Ao construir a sua biblioteca com mais de 40 mil livros num antigo presbitério em França, Alberto Manguel debateu-se com as mesmas questões de um qualquer bibliotecário caseiro: é melhor dividir por línguas? A ordem alfabética será a mais prática? Os géneros não deviam estar agrupados?Mesmo que não existam respostas certas, neste livro Manguel conta pelo menos as melhores histórias. Há bibliotecas públicas com secções como «Esgotos: Obras Seleccionadas», e umas privadas onde, alfabeticamente, os amigos-escritores Borges e Bioy Casares ficam lado a lado. Há bibliotecários corajosos que alteram registos de requisição para salvar livros, e livros corajosos que salvam homens torturados. Há livros perdidos, livros proibidos, livros digitais, livros que ficam numa prateleira demasiado alta e livros imaginados - mas todos eles ocupam um espaço e enchem estantes pelo mundo, tal como preenchem esta Biblioteca à Noite. -
Embalando a Minha BibliotecaO comovente obituário de uma biblioteca.A melancólica operação de encaixotar os seus 35 mil livros, que habitavam num antigo presbitério em França, inspira uma das obras mais pessoais de Alberto Manguel.Edição simultânea em Portugal, EUA e Inglaterra.Em 1931, Walter Benjamin escreveu um pequeno ensaio sobre a experiência de desencaixotar a sua biblioteca, aí reflectindo sobre a relação com os seus livros. Décadas mais tarde, Alberto Manguel, escritor, editor, tradutor e um dos maiores bibliófilos do mundo, decide glosar a operação inversa.No início do século, Manguel instalou a sua imensa biblioteca pessoal num antigo presbitério do Vale do Loire, e sentiu que encontrara uma casa para si e para os seus livros. Mas essa morada acabou por não ser permanente, e os milhares de livros de Manguel estão hoje guardados em caixotes, num depósito no Canadá.Embalando a Minha Biblioteca: uma elegia e dez divagações conta esta história, e constitui quase um manifesto diante da ameaça de esquecimento que cai agora sobre as estantes vazias de Alberto Manguel. Aqui se evoca e se reivindica a biblioteca que continua a existir na mente do leitor, o poder da palavra e os jogos de associações e memórias que os livros, mesmo encaixotados, desencadeiam.Segundo Manguel, uma biblioteca é uma autobiografia com muitas camadas, e Embalando a Minha Biblioteca, ao mesmo tempo que evoca um imenso caudal de memórias pessoais, é acima de tudo uma exaltação do livro como só este escritor sabe fazer.Prémio Formentor 2017. -
No Bosque do EspelhoRecorrendo a histórias pessoais e a reflexões literárias ricas em humor e erudição subtil, Alberto Manguel leva-nos a reflectir sobre as delícias e responsabilidades da leitura - uma viagem despoletada pela humanidade do autor, pela sua curiosidade insaciável e extraordinária abrangência da percepção do mundo.Ver por dentro: -
Monstros FabulososAS PERSONAGENS LITERÁRIAS QUE GANHAM VIDA E FICAM CONNOSCO PARA LÁ DOS LIVROS por Alberto Manguel, um dos maiores bibliófilos do mundo.Com ilustrações do autor e um «monstro» português: O Mandarim, de Eça de Queirós.Desde a infância, há personagens de livros que começam a fazer parte da vida de quem gosta de ler. Depois, e apesar de nós, os leitores, envelhecermos, e de elas, as personagens, teoricamente ficarem na mesma, vão crescendo connosco, sofrendo mutações, fazendo companhia a outras que vão surgindo e ganhando significado para lá dos livros de onde saíram, como amigos de longa data com quem se partilha experiências e emoções.O bibliófilo Alberto Manguel apresenta neste livro, com erudição e humor, mais de 30 das suas personagens preferidas, desde o Jim de Huckleberry Finn ao monstro de Frankenstein, passando pela Capuchinho Vermelho ou pelo marido da Madame Bovary. Através desta partilha, desafia cada leitor a explorar as suas relações pessoais com este tipo de «monstros» imortais e amorosos, e com o tanto que estes transportam em si da condição humana.«Aprendi a minha experiência do mundo — amor, morte, amizade, perda, gratidão, desconcerto, angústia, medo, tudo isto e a minha própria identidade em mutação — com personagens imaginárias que conheci nas minhas leituras, muito mais do que com a minha misteriosa cara no espelho ou o meu reflexo nos olhos dos outros.»Alberto Manguel,in "Prefácio" -
Ler Imagens - Em que pensamos quando olhamos para artePodemos ler um quadro da mesma forma que lemos um livro? Existe algum vocabulário que possamos de aprender para nos ajudar a deslindar os seus significados? Quererá ele ser descodificado, decifrado e compreendido? Em Ler Imagens, livro profusamente ilustrado, Alberto Manguel oferece uma instigante meditação sobre as questões que nos colocamos quando estamos diante de uma obra de arte. -
Ler Imagens- Em que pensamos quando olhamos para artePodemos ler um quadro da mesma forma que lemos um livro? Existe algum vocabulário que possamos de aprender para nos ajudar a deslindar os seus significados? Quererá ele ser descodificado, decifrado e compreendido? Em Ler Imagens, livro profusamente ilustrado, Alberto Manguel oferece uma instigante meditação sobre as questões que nos colocamos quando estamos diante de uma obra de arte.
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Para Tão Curtos Amores, Tão Longa VidaNuma época e num país como o nosso, em que se regista um número muito elevado de divórcios, e em que muitos casais preferem «viver juntos» a casar-se, dando origem nas estatísticas a muitas crianças nascidas «fora do casamento», nesta época e neste país a pergunta mais próxima da realidade não é por que duram tão pouco tantos casamentos, mas antes: Por que é que há casamentos que duram até à morte dos cônjuges? Qual é o segredo? Há um segredo nisso? Este novo livro de Daniel Sampaio, que traz o título tão evocativo: Para Tão Curtos Amores, Tão Longa Vida, discute as relações afetivas breves e as prolongadas, a monogamia e a infidelidade, a importância da relação precoce com os pais e as vicissitudes do amor. Combinando dois estilos, o ficcional e o ensaístico, que domina na perfeição, o autor traz perante os nossos olhos, de modo muito transparente e sem preconceitos, tão abundantes nestas matérias, os problemas e dificuldades dos casais no mundo de hoje, as suas vitórias e derrotas na luta permanente para manterem viva a sua união.Um livro para todos nós porque (quase) todos nós, mais tarde ou mais cedo, passamos por isso. -
Sobre as MulheresSobre as Mulheres é uma amostra substancial da escrita de Susan Sontag em torno da questão da mulher. Ao longo dos sete ensaios e entrevistas (e de uma troca pública de argumentos), são abordados relevantes temas, como os desafios e a humilhação que as mulheres enfrentam à medida que envelhecem, a relação entre a luta pela libertação das mulheres e a luta de classes, a beleza, o feminismo, o fascismo, o cinema. Ao fim de cinquenta anos – datam dos primeiros anos da década de 1970 –, estes textos não envelheceram nem perderam pertinência. E, no seu conjunto, revelam a curiosidade incansável, a precisão histórica, a solidez política e o repúdio por categorizações fáceis – em suma, a inimitável inteligência de Sontag em pleno exercício.«É um deleite observar a agilidade da mente seccionando através da flacidez do pensamento preguiçoso.» The Washington Post«Uma nova compilação de primeiros textos de Sontag sobre género, sexualidade e feminismo.» Kirkus Reviews -
A Vida na SelvaHá quem nasça para o romance ou para a poesia e se torne conhecido pelo seu trabalho literário; e quem chegue a esse ponto depois de percorrer um longo caminho de vida, atravessando os escolhos e a complexidade de uma profissão, ou de uma passagem pela política, ou de um reconhecimento público que não está ligado à literatura. Foi o caso de Álvaro Laborinho Lúcio, que publicou o seu primeiro e inesperado romance (O Chamador) em 2014.Desde então, em leituras públicas, festivais, conferências e textos com destinos vários, tem feito uma viagem de que guarda memórias, opiniões, interesses, perguntas e respostas, perplexidades e reconhecimentos. Estes textos são o primeiro resumo de uma vida com a literatura – e o testemunho de um homem comprometido com as suas paixões e o diálogo com os outros. O resultado é comovente e tão inesperado como foi a publicação do primeiro romance. -
O Infinito num JuncoA Invenção do livro na antiguidade e o nascer da sede dos livros.Este é um livro sobre a história dos livros. Uma narrativa desse artefacto fascinante que inventámos para que as palavras pudessem viajar no tempo e no espaço. É o relato do seu nascimento, da sua evolução e das suas muitas formas ao longo de mais de 30 séculos: livros de fumo, de pedra, de argila, de papiro, de seda, de pele, de árvore, de plástico e, agora, de plástico e luz.É também um livro de viagens, com escalas nos campos de batalha de Alexandre, o Grande, na Villa dos Papiros horas antes da erupção do Vesúvio, nos palácios de Cleópatra, na cena do homicídio de Hipátia, nas primeiras livrarias conhecidas, nas celas dos escribas, nas fogueiras onde arderam os livros proibidos, nos gulag, na biblioteca de Sarajevo e num labirinto subterrâneo em Oxford no ano 2000.Este livro é também uma história íntima entrelaçada com evocações literárias, experiências pessoais e histórias antigas que nunca perdem a relevância: Heródoto e os factos alternativos, Aristófanes e os processos judiciais contra humoristas, Tito Lívio e o fenómeno dos fãs, Sulpícia e a voz literária de mulheres.Mas acima de tudo, é uma entusiasmante aventura coletiva, protagonizada por milhares de personagens que, ao longo do tempo, tornaram o livro possível e o ajudaram a transformar-se e evoluir – contadores de histórias, escribas, ilustradores e iluminadores, tradutores, alfarrabistas, professores, sábios, espiões, freiras e monjes, rebeldes, escravos e aventureiros.É com fluência, curiosidade e um permanente sentido de assombro que Irene Vallejo relata as peripécias deste objeto inverosímil que mantém vivas as nossas ideias, descobertas e sonhos. E, ao fazê-lo, conta também a nossa história de leitores ávidos, de todo o mundo, que mantemos o livro vivo.Um dos melhores livros do ano segundo os jornais El Mundo,La Vanguardia e The New York Times(Espanha). -
O Anticrítico«O Anticrítico» é uma compilação dos ensaios de Diogo Vaz Pinto — textos de crítica literária, e não só —, escritos entre 2014 e 2023, incluindo alguns inéditos. «Não tenho conta para as vezes todas em que, para ir com a rábula insultuosa que me tecem, pegando uns onde outros deixaram, numa cooperativa de imbecis que, sinceramente, me comove, já me quiseram tirar a condição que vem de tudo o que faço. Mais difícil seria desmontar alguma coisa. Resta que, ou ignoram muito vermelhuscos, ou a ideia é revogar-me a carta, licença, prostrar-me na indigência de eu ser uma qualquer abominação, «Bicho», monstro que ligam com tudo o que é baixo, e mesmo assim paira sobre eles sem explicação. Um Chernobyl encarnado. Crítico não sou. Ou só pseudo. Videirinho e jornaleiro, pilha-galinhas e o mais que eu coso bem ao meu estuporado currículo. Pois seja, eu fico então gordo disso tudo. E viro-me do avesso. Sou o anticrítico, então! Roubando esta de Augusto de Campos sem pudor. Há muito que não me retiram do sentido a ideia de que o principal é cortar com a impostura disto tudo. A gloríola da mediocridade, o sentido gregário, essa ratada ficção ligando os «egozinhos de porta-aberta» do nosso meio literato.» -
Terra QueimadaEnsaio profético e demolidor, TERRA QUEIMADA (2022) expõe a forma como o complexo internético se tornou «motor implacável de vício, solidão, falsas esperanças, crueldade, psicose, endividamento, vida desbaratada, corrosão da memória e desintegração social». Nele, Jonathan Crary faz uma crítica radical da digitalização do mundo e denuncia realidades inegáveis: a incompatibilidade entre um planeta habitável e a economia consumista e técnica, a atomização provocada pelas redes sociais, a era digital como fase terminal do capitalismo planetário. «Se é possível um futuro habitável e comum no nosso planeta», conclui, «esse futuro será offline, dissociado dos sistemas e da actividade do capitalismo 24/7, que destroem o mundo». -
Mário Cesariny e Antonio Tabucchi - Cartas e outros TextosFernando Cabral Martins: «O surrealismo português já tinha atingido no final dos anos sessenta uma definição que tornava possível, de um ponto de vista exterior, descomprometido, fazer uma avaliação de conjunto.» Antonio Tabucchi veio a Portugal no rasto de um poeta: Fernando Pessoa, ou melhor Álvaro de Campos, de quem lera por acaso o poema «Tabacaria». Quis aprender a língua do autor do poema e para isso inscreveu-se na cadeira de Língua e Literatura Portuguesa na Universidade de Pisa, que então frequentava. O seu mestre foi uma professora especial, bela, inteligente e culta, Luciana Stegagno Picchio. Antonio quis conhecer o país onde se falava aquela língua e ao qual pertencia aquele poeta e, na Primavera de 1965, com o seu Fiat 500, chegou a Portugal. Aí conheceu uma portuguesa com quem falou de Pessoa, e com quem continuou a trocar correspondência até ao ano seguinte, quando se tornaram namorados, vindo depois a casar (1970). Mas até lá, veio amiúde a Portugal […] e começou a interessar-se pelo Surrealismo português, sobre o qual havia muito pouco material crítico, praticamente nada, em vista da sua futura tese de licenciatura. Conheceu então (1967) dois membros ilustres daquele movimento, dois grandes poetas, Alexandre O’Neill e Mário Cesariny de Vasconcelos, com quem passou muitas horas, primeiro para os entrevistar e depois, com sempre maior intimidade, já com laços de amizade, só pelo prazer de estarem juntos. [Maria José de Lancastre] Esta é a história de um desencontro. Cesariny, como o surrealismo, considerava a universidade um inimigo, e Tabucchi, para todos os efeitos, era em 1971 um universitário. Mesmo se, no caso dele, havia por parte do poeta o agrado de ver como a sua poesia e o seu lugar no surrealismo português eram reconhecidos — pela primeira vez — por um leitor com a distância crítica e a óbvia inteligência de Antonio Tabucchi. Aqui, nos textos que documentam o contacto directo entre ambos do final dos anos 60, pode ver-se uma ilustração do modo como a história do surrealismo foi sendo feita, com que ritmo e a partir de que posições. E que implica a consciência, por parte do poeta, da importância do sentido que a crítica atribui à História, capaz (ou não) de tornar o passado digno do presente, ou vice- -versa. E manifesta, por parte do jovem crítico italiano, a intuição da grandeza de um movimento que evoluía na sombra, num carceral jardim à beira-mar. [Fernando Cabral Martins]
