Paisagens Junqueirianas - Com o Douro ao fundo
Tudo é, afinal, aproximação, misterioso cerzir de fios, convocação de matéria fragmentária.
Incomoda-me a monótona repetibilidade de temas, fontes e perspetivas que paira sobre o universo junqueiriano, quando uma rede de veios corre ainda oculta e confusa. Aqui se reúnem textos de natureza, temática, perspetiva e dimensão desiguais, segundo uma cadência de escrita espaçada no tempo. Refletem, porventura, diferentes metodologias e estratégias. Também eles são fragmento de um imenso todo.
Doutorado em Cultura, é Professor na Universidade Católica Portuguesa, Escola das Artes (Porto), onde leciona, entre outras, Cultura Portuguesa e Literatura Universal.
Investigador do Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (CLEPUL), do Centro de Investigação em Ciência e Tecnologia das Artes (CITAR), do Grupo de Estudos Literários e Culturais da Universidade de Aveiro, é membro do Conselho Científico de revistas académicas e da Cátedra Poesia e Transcendência - Sophia de Mello Breyner Andresen.
Autor de uma vasta bibliografia, em especial no âmbito da cultura portuguesa, de que se destacam os trabalhos sobre Guerra Junqueiro, é também jornalista, argumentista, produtor/realizador (pela New York Film Academy) de curtas e longas-metragens. Durante cerca de vinte anos realizou e apresentou programas radiofónicos (RR, RFM e Antena 2).
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À Volta de Padre Baptista«Calvário» é palavra comum na nossa linguagem e em muitos lugares. Uma vida difícil é um «calvário» e até determinados sítios se chamam assim. Como «Cruz», que desde traço especifico a apelido de família, também, aparece. Mas nem sempre foi assim. Na antiga Roma dava nome a um terrível suplício. Tão terrível que as primeiras gerações cristãs demoraram um tanto a adoptá-la como sinal. Mas era inevitável que o fizessem, por significar, com todo o realismo, o ponto final da vida terrena do Fundador do Cristianismo, ponto inicial da vida da Igreja que vive da Cruz do seu Senhor. Logo o descobriu São Paulo, encontrando aí mesmo a sua glória, na Cruz em que Cristo inteiramente se entregara, fazendo do suplício uma dádiva. Cruz levantada no Calvário, podendo agora toda a terra ser também Calvário, transfigurado pela Cruz: de lugar de sofrimento, tornar-se em fonte de caridade e de paz. Aqui, as palavras comuns passam a comunicar o absoluto. O absoluto do amor de Deus feito um de nós, para nos resgatar duma vida sem Deus. Na verdade, só o amor de Cristo nos redime, qual Cruz luminosa, no Calvário transformado em Éden do homem novo. - Encontrámo-lo em Beire? Há várias décadas que muita gente o confirma. E em todo esse tempo o referem a um nome que também se tornou comum: Padre Baptista. Conheci-o nos anos oitenta, das suas idas ao Seminário dos Olivais. Passavam por lá muitas pessoas e todas tinham coisas para contar, da vida da Igreja e do mundo, da Igreja no mundo. Mas o Padre Baptista não era assim tão comum; nem sequer falava da vida, era mais a vida que falava. A sua vida e a vida de tantos que fizera sua também. Vida e convivência, portanto. Porque o dia-a-dia que nos relatava consistia na atenção constante e mútua que idosos e enfermos prestavam uns aos outros, onde o companheirismo tomava o lugar do assistencialismo. Não teorizava, contava apenas. Como a história do doente quase terminal que acabou por durar anos, só porque lhe deram a oportunidade de jardinar. Como a outra, em que dois homens com grandes limitações físicas punham a mesa comum, complementando os gestos necessários que nenhum poderia fazer sozinho... Mas, por dentro destas histórias, está a densidade que as palavras comuns e as coisas comezinhas só alcançam quando as anima um coração como o de há dois mil anos no Calvário essencial. Obrigado, Padre Baptista! D. Manuel Clemente [Cardeal Patriarca] -
Raízes do Tempo: À volta do Padre AméricoQuem foi realmente o Padre Américo? Um livro que tenta responder a esta questão sobre uma das figuras mais marcantes de Portugal no século XX, através de entrevistas e testemunhos de várias personalidades que o conheceram bem, assim como a Obra por ele fundada. O Padre Américo pertence ao restrito lote dos homens que nos obrigam a todos a uma profunda revisão interior: é uma conclusão fundamental que surge da leitura deste livro apaixonante. -
Guerra Junqueiro na Lusofilia Francesa: Traduções (Poesia)O presente livro, deliberadamente circunscrito às relações de Guerra Junqueiro com os lusófilos e tradutores franceses, é, antes de mais, um trabalho de arqueologia literária e um esforço de fixação de memória. Pretende desmontar a convicção vigente de que a figura e obra poética de Guerra Junqueiro nunca penetrou ou teve eco no meio cultural em França. Aqui se abordam, entre outros, autores como: Philéas Lebesgue, Maxime Formont, Achille Millien, Jules Supervielle, Fernand Lambert, Isabel Meyreles e Evelyne Kesteven. -
Fica Junto de MimUma visão de esperança e serenidade sobre a morte, quando somos confrontados com a partida dos nossos seres queridos. Sentimos a partida dos que nos morrem na medida em que os amámos. Dir-se-ia que precisamos deles para respirar, porque não se trata de um eu que chora e de um tu que morreu, mas de um nós, e por isso os sentimos mais próximos do que um abraço. Mas é diferente. Perdemos a possibilidade de os ouvir, de lhes dizer o tanto que devia ainda ser dito. E as lágrimas são-nos necessárias para que a dor nos não sufoque. O autor, Henrique Manuel Pereira, é professor da Universidade Católica e autor de livros e programas de Rádio de grande êxito.
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Para Tão Curtos Amores, Tão Longa VidaNuma época e num país como o nosso, em que se regista um número muito elevado de divórcios, e em que muitos casais preferem «viver juntos» a casar-se, dando origem nas estatísticas a muitas crianças nascidas «fora do casamento», nesta época e neste país a pergunta mais próxima da realidade não é por que duram tão pouco tantos casamentos, mas antes: Por que é que há casamentos que duram até à morte dos cônjuges? Qual é o segredo? Há um segredo nisso? Este novo livro de Daniel Sampaio, que traz o título tão evocativo: Para Tão Curtos Amores, Tão Longa Vida, discute as relações afetivas breves e as prolongadas, a monogamia e a infidelidade, a importância da relação precoce com os pais e as vicissitudes do amor. Combinando dois estilos, o ficcional e o ensaístico, que domina na perfeição, o autor traz perante os nossos olhos, de modo muito transparente e sem preconceitos, tão abundantes nestas matérias, os problemas e dificuldades dos casais no mundo de hoje, as suas vitórias e derrotas na luta permanente para manterem viva a sua união.Um livro para todos nós porque (quase) todos nós, mais tarde ou mais cedo, passamos por isso. -
NovidadeSobre as MulheresSobre as Mulheres é uma amostra substancial da escrita de Susan Sontag em torno da questão da mulher. Ao longo dos sete ensaios e entrevistas (e de uma troca pública de argumentos), são abordados relevantes temas, como os desafios e a humilhação que as mulheres enfrentam à medida que envelhecem, a relação entre a luta pela libertação das mulheres e a luta de classes, a beleza, o feminismo, o fascismo, o cinema. Ao fim de cinquenta anos – datam dos primeiros anos da década de 1970 –, estes textos não envelheceram nem perderam pertinência. E, no seu conjunto, revelam a curiosidade incansável, a precisão histórica, a solidez política e o repúdio por categorizações fáceis – em suma, a inimitável inteligência de Sontag em pleno exercício.«É um deleite observar a agilidade da mente seccionando através da flacidez do pensamento preguiçoso.» The Washington Post«Uma nova compilação de primeiros textos de Sontag sobre género, sexualidade e feminismo.» Kirkus Reviews -
NovidadeA Vida na SelvaHá quem nasça para o romance ou para a poesia e se torne conhecido pelo seu trabalho literário; e quem chegue a esse ponto depois de percorrer um longo caminho de vida, atravessando os escolhos e a complexidade de uma profissão, ou de uma passagem pela política, ou de um reconhecimento público que não está ligado à literatura. Foi o caso de Álvaro Laborinho Lúcio, que publicou o seu primeiro e inesperado romance (O Chamador) em 2014.Desde então, em leituras públicas, festivais, conferências e textos com destinos vários, tem feito uma viagem de que guarda memórias, opiniões, interesses, perguntas e respostas, perplexidades e reconhecimentos. Estes textos são o primeiro resumo de uma vida com a literatura – e o testemunho de um homem comprometido com as suas paixões e o diálogo com os outros. O resultado é comovente e tão inesperado como foi a publicação do primeiro romance. -
O Infinito num JuncoA Invenção do livro na antiguidade e o nascer da sede dos livros.Este é um livro sobre a história dos livros. Uma narrativa desse artefacto fascinante que inventámos para que as palavras pudessem viajar no tempo e no espaço. É o relato do seu nascimento, da sua evolução e das suas muitas formas ao longo de mais de 30 séculos: livros de fumo, de pedra, de argila, de papiro, de seda, de pele, de árvore, de plástico e, agora, de plástico e luz.É também um livro de viagens, com escalas nos campos de batalha de Alexandre, o Grande, na Villa dos Papiros horas antes da erupção do Vesúvio, nos palácios de Cleópatra, na cena do homicídio de Hipátia, nas primeiras livrarias conhecidas, nas celas dos escribas, nas fogueiras onde arderam os livros proibidos, nos gulag, na biblioteca de Sarajevo e num labirinto subterrâneo em Oxford no ano 2000.Este livro é também uma história íntima entrelaçada com evocações literárias, experiências pessoais e histórias antigas que nunca perdem a relevância: Heródoto e os factos alternativos, Aristófanes e os processos judiciais contra humoristas, Tito Lívio e o fenómeno dos fãs, Sulpícia e a voz literária de mulheres.Mas acima de tudo, é uma entusiasmante aventura coletiva, protagonizada por milhares de personagens que, ao longo do tempo, tornaram o livro possível e o ajudaram a transformar-se e evoluir – contadores de histórias, escribas, ilustradores e iluminadores, tradutores, alfarrabistas, professores, sábios, espiões, freiras e monjes, rebeldes, escravos e aventureiros.É com fluência, curiosidade e um permanente sentido de assombro que Irene Vallejo relata as peripécias deste objeto inverosímil que mantém vivas as nossas ideias, descobertas e sonhos. E, ao fazê-lo, conta também a nossa história de leitores ávidos, de todo o mundo, que mantemos o livro vivo.Um dos melhores livros do ano segundo os jornais El Mundo,La Vanguardia e The New York Times(Espanha). -
O Anticrítico«O Anticrítico» é uma compilação dos ensaios de Diogo Vaz Pinto — textos de crítica literária, e não só —, escritos entre 2014 e 2023, incluindo alguns inéditos. «Não tenho conta para as vezes todas em que, para ir com a rábula insultuosa que me tecem, pegando uns onde outros deixaram, numa cooperativa de imbecis que, sinceramente, me comove, já me quiseram tirar a condição que vem de tudo o que faço. Mais difícil seria desmontar alguma coisa. Resta que, ou ignoram muito vermelhuscos, ou a ideia é revogar-me a carta, licença, prostrar-me na indigência de eu ser uma qualquer abominação, «Bicho», monstro que ligam com tudo o que é baixo, e mesmo assim paira sobre eles sem explicação. Um Chernobyl encarnado. Crítico não sou. Ou só pseudo. Videirinho e jornaleiro, pilha-galinhas e o mais que eu coso bem ao meu estuporado currículo. Pois seja, eu fico então gordo disso tudo. E viro-me do avesso. Sou o anticrítico, então! Roubando esta de Augusto de Campos sem pudor. Há muito que não me retiram do sentido a ideia de que o principal é cortar com a impostura disto tudo. A gloríola da mediocridade, o sentido gregário, essa ratada ficção ligando os «egozinhos de porta-aberta» do nosso meio literato.» -
Terra QueimadaEnsaio profético e demolidor, TERRA QUEIMADA (2022) expõe a forma como o complexo internético se tornou «motor implacável de vício, solidão, falsas esperanças, crueldade, psicose, endividamento, vida desbaratada, corrosão da memória e desintegração social». Nele, Jonathan Crary faz uma crítica radical da digitalização do mundo e denuncia realidades inegáveis: a incompatibilidade entre um planeta habitável e a economia consumista e técnica, a atomização provocada pelas redes sociais, a era digital como fase terminal do capitalismo planetário. «Se é possível um futuro habitável e comum no nosso planeta», conclui, «esse futuro será offline, dissociado dos sistemas e da actividade do capitalismo 24/7, que destroem o mundo». -
Mário Cesariny e Antonio Tabucchi - Cartas e outros TextosFernando Cabral Martins: «O surrealismo português já tinha atingido no final dos anos sessenta uma definição que tornava possível, de um ponto de vista exterior, descomprometido, fazer uma avaliação de conjunto.» Antonio Tabucchi veio a Portugal no rasto de um poeta: Fernando Pessoa, ou melhor Álvaro de Campos, de quem lera por acaso o poema «Tabacaria». Quis aprender a língua do autor do poema e para isso inscreveu-se na cadeira de Língua e Literatura Portuguesa na Universidade de Pisa, que então frequentava. O seu mestre foi uma professora especial, bela, inteligente e culta, Luciana Stegagno Picchio. Antonio quis conhecer o país onde se falava aquela língua e ao qual pertencia aquele poeta e, na Primavera de 1965, com o seu Fiat 500, chegou a Portugal. Aí conheceu uma portuguesa com quem falou de Pessoa, e com quem continuou a trocar correspondência até ao ano seguinte, quando se tornaram namorados, vindo depois a casar (1970). Mas até lá, veio amiúde a Portugal […] e começou a interessar-se pelo Surrealismo português, sobre o qual havia muito pouco material crítico, praticamente nada, em vista da sua futura tese de licenciatura. Conheceu então (1967) dois membros ilustres daquele movimento, dois grandes poetas, Alexandre O’Neill e Mário Cesariny de Vasconcelos, com quem passou muitas horas, primeiro para os entrevistar e depois, com sempre maior intimidade, já com laços de amizade, só pelo prazer de estarem juntos. [Maria José de Lancastre] Esta é a história de um desencontro. Cesariny, como o surrealismo, considerava a universidade um inimigo, e Tabucchi, para todos os efeitos, era em 1971 um universitário. Mesmo se, no caso dele, havia por parte do poeta o agrado de ver como a sua poesia e o seu lugar no surrealismo português eram reconhecidos — pela primeira vez — por um leitor com a distância crítica e a óbvia inteligência de Antonio Tabucchi. Aqui, nos textos que documentam o contacto directo entre ambos do final dos anos 60, pode ver-se uma ilustração do modo como a história do surrealismo foi sendo feita, com que ritmo e a partir de que posições. E que implica a consciência, por parte do poeta, da importância do sentido que a crítica atribui à História, capaz (ou não) de tornar o passado digno do presente, ou vice- -versa. E manifesta, por parte do jovem crítico italiano, a intuição da grandeza de um movimento que evoluía na sombra, num carceral jardim à beira-mar. [Fernando Cabral Martins]
